Além dos problemas de saúde graves, existem diversos problemas psicológicos e sociais associados à obesidade infantil. A intervenção psicológica desempenha o seu papel na prevenção e tratamento.

Artigo da responsabilidade da Dra. Marisa Marques. Psicóloga Clínica e da Saúde Trofa Saúde Hospital de Barcelos e Trofa Saúde Hospital de Braga Norte.

 

A prevalência do excesso de peso e da obesidade teve um grande e rápido crescimento ao longo das últimas décadas e tem sido descrita como uma “epidemia global” desde a infância à idade adulta. Segundo a Organização Mundial de Saúde, uma em cada três crianças de 5 a 10 anos está acima do peso recomendado pela própria organização. Pelo que é considerada uma questão de saúde pública.

De acordo com a Comissão Europeia (2023), Portugal está entre os países europeus com maior número de crianças afetadas por esta epidemia. Sendo que “29% das crianças portuguesas entre 2 e 5 anos têm excesso de peso e 12,5% são obesas. Na faixa etária dos 6 aos 8 anos, a prevalência do excesso de peso é de 32% e a da obesidade é de 13,9%”.

FATORES DE RISCO

Um dos fatores mais importantes para o desenvolvimento da obesidade infantil está associado aos maus hábitos familiares, nomeadamente a nível alimentar. Logo, a ingestão alimentar inadequada nos primeiros anos de vida faz com que as crianças aprendam estes hábitos irregulares, provocando um aumento descontrolado no peso.

Além destas situações, também outros fatores podem estar na base, tais como: problemas hormonais, relações familiares desajustadas, problemas genéticos, problemas psicológicos, fatores ambientais ou outros problemas de saúde. Sabendo que doenças endócrinas e genéticos são apenas responsáveis por menos de 1% da obesidade infantil.

De facto, uma alimentação desequilibrada, associada ao sedentarismo e à reduzida prática de exercício físico, contribuem significativamente para os elevados níveis de obesidade infantil em Portugal. Neste caso, o maior fator de predisposição ao excesso de peso e à obesidade é o sedentarismo. As crianças passam grande parte do seu tempo em frente aos ecrãs e com comportamentos aditivos em relação às novas tecnologias (videojogos, redes sociais, televisão, etc). Isso faz com que os níveis de atividade física sejam diminutos ou mesmo inexistentes.

Os fatores de risco podem estar presente de forma individual ou em conjunto. Sendo que a predisposição genética, por si só, já pode ser considerada um grande fator de risco. Porém, já vimos que o problema só evolui se o ambiente em que a criança está assim o permitir. E isso depende principalmente da influência paternal e de figuras de vinculação. Pelo que os pais deverão começar logo desde os primeiros passos da criança a promover e incentivar brincadeiras, atividades e exercícios recreativos que a façam movimentar constantemente.

CONSEQUÊNCIAS E IMPACTO PSICOLÓGICO

Na ótica da Psicologia, são inúmeros os problemas emocionais, comportamentais e de socialização que se encontram associados ao excesso de peso e à obesidade infantil. Por exemplo, o preconceito de que as pessoas obesas são preguiçosas e não têm força de vontade conduz à sua discriminação, resultando em sofrimento psicológico e alienação social, interpessoal, educacional e/ou profissional.

Mesmo em crianças, esta discriminação é visível, quer por parte dos adultos (que julgam os pais e as crianças obesas), quer por parte dos seus pares, através de comentários e situações de bullying. Estas situações resultam numa grande vulnerabilidade psicológica, através de uma autoperceção negativa, baixa autoestima, inseguranças, problemas sociais e interpessoais, diminuição do desempenho escolar e desenvolvimento de psicopatologias.

PSICOLOGIA NA OBESIDADE

Obesidade infantil também pode ser potencializada pelas perturbações emocionais e psicológicas. Nestes casos, é imprescindível o pedido de apoio de Psicologia Infantil, para evitar ou prevenir a evolução da patologia.

A intervenção na Obesidade Infantil, de forma a prevenir a propagação da doença na idade adulta, passa por envolver mudanças nos comportamentos e no estilo de vida. É, desta forma, necessário que os profissionais de saúde estudem todos os aspetos ambientais, socioculturais e psicológicos da criança, de modo a ser possível a alteração dos seus hábitos alimentares e físicos.

Portanto, após o diagnóstico pela Pediatria, juntamente com a Nutrição e a Psicologia Infantil, irá definir-se a melhor intervenção de acordo com o perfil e o grau de obesidade na criança. Sendo de salientar que esta intervenção não é exclusiva à criança, mas envolve toda a família. O primeiro passo é a promoção de uma restruturação da vida familiar da criança obesa, através da mudança de hábitos.

As intervenções psicológicas através das estratégias comportamentais e cognitivo-comportamentais, quando combinadas com dietas e exercício físico, são eficazes na perda de peso. No entanto, nas crianças, as intervenções familiares – que envolvem os pais em atividades físicas e de promoção de saúde – são mais eficazes no tratamento do excesso de peso e obesidade.

É importante realçar que o nosso principal objetivo hoje, enquanto psicólogos e profissionais de saúde, é proporcionar a modificação de comportamentos multifacetados e baseados na família, em que os pais assumem o papel principal da responsabilidade na mudança comportamental.

Leia o artigo completo na edição de abril 2024 (nº 348)