O fenómeno não é recente nem é exclusivo do mundo do cinema e da televisão. Centenas de milhares de mulheres, em todo o mundo e de todos os setores laborais, veem-se confrontadas com propostas de favores sexuais por parte dos respetivos superiores hierárquicos. Contudo, o medo perdeu terreno e as denúncias sucedem-se.

 

“O diretor, cada vez que vinha ao meu escritório, acariciava-me o pescoço. Quando terminava o horário de trabalho, reunia umas quantas funcionárias, geralmente as mais jovens e de melhor aspeto físico, e convidava-nos para tomar um copo no gabinete, depois de desligar os telefones. Os restantes executivos comportavam-se de forma semelhante. Cada vez que lhes agradava uma nova estagiária, iam ter com ela, faziam-lhe a corte e iniciavam, então, o contacto físico: começavam por apoiar a mão nos ombros, braços e costas, até que acabavam por lhe apalpar as coxas ou os seios, fazendo-lhe propostas indecentes… Quem não correspondia aos assédios sofria represálias ou recebia uma carta a pôr fim ao estágio”.

Esta é apenas uma das muitas declarações efetuadas perante o juiz por várias empregadas de uma empresa multinacional bem estabelecida no mercado norte-americano. Estas jovens forneceram todos os pormenores, perante um tribunal que examinava mais de uma dezena de denúncias de assédio sexual no trabalho, um dos maiores escândalos “made in USA” que, há alguns anos, saltaram para as primeiras páginas dos jornais.

Outro caso paradigmático atingiu, há algum tempo, uma firma japonesa a laborar nos Estados Unidos, tendo ultrapassado todos os recordes de denúncias de assédio sexual junto das funcionárias. Segundo as investigações do Ministério Norte-Americano do Trabalho, essa empresa teve de prestar contas por quase 700 casos de mulheres afetadas por humilhação sexual. Nas paredes das casas de banho dos homens, anotavam-se, por exemplo, os nomes das mulheres melhor dotadas, com detalhes mórbidos sobre os seus gestos específicos durante o ato sexual.

Mais recentemente, os casos envolvendo homens poderosos da indústria de Hollywood colocou o tema, de novo, sob os holofotes da opinião pública.

A praga de assédios sexuais no local de trabalho não é, seguramente, um fenómeno novo, nem exclusivamente americano, nem restrito ao universo do cinema e da televisão, mas a coragem para a denúncia alcançou, sem dúvida, toda a sua força.

Ainda o Medo de falar

Os especialistas recordam que a proporção de denúncias oficialmente registadas é muito baixa face à realidade, não passando da ponta do iceberg de um fenómeno gravíssimo, que afeta centenas de milhares de mulheres anónimas, as quais são profissionalmente tão ou mais competentes que os respetivos colegas do sexo oposto.

A razão evidente é o medo de enfrentar uma causa legal complexa, dispendiosa e difícil, o temor pela intromissão na vida privada, o pavor dos interrogatórios e a publicidade mórbida que estes casos geram, arruinando, com frequência, famílias, carreiras ou a própria estabilidade emocional das afetadas.

Felizmente, o clima interno de muitas empresas tem vindo a rarefazer-se, tanto que muitas delas já organizam cursos e seminários especiais sobre o comportamento dos empregados de ambos os sexos. Também se distribuem vídeos ou revistas internas que se dedicam a explicar como evitar o assédio sexual – às mulheres – ou como ter cuidado para não fazer propostas mais ou menos perigosas – no caso dos empregados masculinos.

Por outro lado, muitos executivos começaram a tomar sérias precauções, que chegam, em muitos casos, a ser ridículas e obsessivas, tais como evitar subir no mesmo elevador com as suas subordinadas, porque o mínimo cumprimento, o mínimo roçar ou a mais inocente conversa podem trazer-lhes graves dissabores.

Leia o artigo completo na edição de janeiro 2018 (nº 279)