Fadiga, ansiedade, manifestações cutâneas, dor nas articulações ou dano de órgãos são alguns dos sintomas com que muitas pessoas diagnosticadas com lúpus eritematoso sistémico (LES) têm de viver. Uma doença autoimune, considerada um problema de saúde global, que afeta pessoas de todas as nacionalidades, raças, etnias, géneros e idades, podendo também afetar qualquer parte do corpo, de qualquer forma e em qualquer altura, muitas vezes com resultados imprevisíveis e que mudam vidas.
Mas nem tudo são más notícias. De acordo com o Prof. Dr. José Delgado Alves, presidente do Núcleo de Estudos de Doenças Auto-imunes da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna, “nos últimos tempos houve um desenvolvimento extraordinário na descoberta e na identificação de novos medicamentos que podem ser úteis nos doentes com LES. A realidade é que nós, neste momento, começamos a ter um conjunto de armas para tratar estes doentes que antes não tínhamos. E isto são notícias excecionais”.
Estima-se que, em todo o mundo, mais de cinco milhões de pessoas vivam com esta doença, que, segundo José Delgado Alves, “é muito complexa e cujo diagnóstico é na maioria das vezes difícil, exatamente pelo facto de os doentes se poderem apresentar com múltiplas manifestações, todas elas potencialmente diferentes e que podem evoluir de forma muito diversa”.
E se, inicialmente, se acreditava que “o lúpus era uma doença complexa nas suas manifestações clínicas, complexa nos seus mecanismos, mas provavelmente resultava de um conjunto definido de transformações, hoje em dia temos a noção que é muito mais do que isso. O LES acaba por ser a consequência clínica de variados tipos de alterações imunológicas, fisiopatológicas, que faz com que, no final, esta doença possa ser tão diferente”.
Uma diferença que se traduz, na prática clínica, por “muitos ‘tipos’ de lúpus. Este avanço, esta consciência de que o lúpus acaba por ser ‘um conjunto de doenças mais do que uma doença só’, permitiu perceber que os doentes podem e devem ser tratados com medicamentos que são mais gerais para todos, mas muitas vezes com medicamentos específicos, tendo em conta as alterações que aquele doente tem naquela doença em particular”.
As novas terapêuticas permitem isso mesmo, mas obrigam, segundo o especialista, “a que os centros que tratam estes doentes tenham cada vez mais a capacidade, não só de diagnosticar o mais cedo possível a doença, mas também de identificar quais os mecanismos e as vias que estão presentes em cada doente específico e, com isso, escolher o melhor tratamento. Isto é, sem dúvida, um mundo novo, com inúmeras perspetivas para os doentes com lúpus e esperemos que possamos ter ainda mais respostas no futuro”.
No que diz respeito ao tratamento atempado, que faz a diferença para a qualidade de vida dos doentes, “sendo o lúpus uma doença tão complexa, todos estes medicamentos são inevitavelmente caros e obrigam a uma vigilância por centros que sejam, de facto, especializados. E isto faz com que tenha que haver cautela na disponibilização dos mesmos, porque o seu uso fora de tempo ou despropositado pode, porventura, ter mais consequências nefastas do que boas”, argumenta José Delgado Alves.
No entanto, o especialista considera que “são, na maior parte dos casos, medicamentos seguros e que, quando bem utilizados, permitem uma resposta extraordinária por parte dos doentes. E esta deve ser a principal mensagem: são medicamentos seguros, que permitem ótimas respostas, mas têm que ser utilizados com conhecimento. É verdade que, provavelmente, a maior parte dos doentes, particularmente em centros com menos experiência, não terão acesso fácil aos medicamentos mais recentes, mas isto, como em tudo, é uma faca de dois gumes: por um lado, o cuidado que a medicina tem que ter em não se precipitar na utilização de fármacos e ter a certeza que eles são uma mais-valia; por outro lado, a gestão financeira inerente ao facto destes medicamentos serem caros. Como disse, ter acesso ainda não é fácil, mas nos centros com mais diferenciação já começa a ser feito de forma mais regular e rotineira e espero que, no futuro, possa ser feita de forma mais tranquila e mais fácil, desde que sejam cumpridos os requisitos adequados para a prescrição aos doentes”.