O “Saúdes” é um projeto de conhecimento que se quer independente. Porquê “Saúdes”? Porque acreditamos que a saúde é muito marcada por fatores individuais e sociais, logo, não existe uma saúde única, mas tantas quantas os portugueses. O “Saúdes” pretende exatamente estudar esta multiplicidade de que é feita a saúde em Portugal.

 

Ageas Seguros

Artigo da responsabilidade do Dr. Pedro Correia, diretor de Redes e Clínica Médis

 

O primeiro estudo projeto “Saúdes”, lançado no início de maio, é “A Saúde dos Portugueses: um BI em nome próprio”. Trata-se de uma reflexão sociológica, complementar aos inúmeros estudos já existentes, maioritariamente focados na perspetiva clínica ou estatística. O trabalho de campo foi feito entre outubro/novembro de 2020 (vertente qualitativa, 18 entrevistas aprofundadas) e em janeiro/fevereiro de 2021 (vertente quantitativa, 1029 inquéritos, numa amostra representativa da população portuguesa).

Neste estudo foram explorados cinco indicadores de saúde, que passarão a ser monitorizados regularmente, dos quais revelámos para já dois: a “Saúde que se tem”, onde os inquiridos fazem uma avaliação da sua saúde numa escala de 1 a 10; e a “Potência Saúde”, que avalia (numa escala de 0,5 a 10) em que medida as pessoas estão a empenhar-se para melhorar o seu estado de saúde.

Ideias a reter

Dos indicadores agora revelados, quais as principais ideias a reter?

1.

A biografia e a história individual (muito para além da biologia) condiciona a perceção individual que se tem da saúde, a qual muitas vezes diverge da profissional/médica, com tudo o que isso implica.

O autoconceito e a autoconfiança impactam fortemente a forma como é gerida a nossa saúde. As ideias que cada indivíduo tem sobre si e sobre aquilo que gostaria de ser influenciam muitíssimo a adoção de comportamentos de saúde, assim como a confiança em enfrentar novos desafios neste domínio.

2. 

Na avaliação individual da saúde, a componente física é muito mais valorizada que a psicológica/mental. Esta última é desvalorizada, sobretudo junto dos mais velhos, que manifestamente não estão despertos para o tema.

Como é difícil de acreditar que a idade dissolva os problemas relacionados com a saúde mental, o estudo levanta a hipótese de que a excelente pontuação que as pessoas de 65 ou mais anos dão à sua saúde mental possa estar afetada pelo estigma ou por uma visão redutora da mesma.

3.

Em termos de escala de saúde, de 1 a 10, em que 1 corresponde a “nada saudável” e 10 a “muito saudável”, a maioria dos portugueses avalia relativamente bem o seu estado de saúde.

O nível médio situa-se no 7,3, com mais de metade dos portugueses acima dos 18 anos a avaliar o seu estado como “bom” ou “muito bom” (52%), 31% a considerarem o seu estado de saúde como “razoável” e 17% como “mau” ou “muito mau”. Esta boa avaliação pode, contudo, estar inflacionada pela desvalorização que ainda se faz da saúde psicológica.

4. 

Na forma como os portugueses autoavaliam a sua saúde, o estudo assinala ainda a existência de uma clara questão de género. As mulheres atribuem genericamente pior pontuação à sua saúde do que os homens (7,1 contra 7,4), sendo que 1 em cada 5 diz considerar-se “pouco ou muito pouco saudável”. Apesar disso, e em total contradição com esta avaliação, as mulheres são mais cuidadosas e tendem a ter mais comportamentos “pró-saúde” do que os homens (6,10 contra 5,96).

5.

O estudo propõe um exercício de segmentação da população quanto a dois tipos de comportamentos: reativos (prevenção, defesa do estado de saúde atual); pró-ativos (potenciação, comportamentos com vista à melhoria da saúde).

O estudo mostra que existe uma correlação direta entre a felicidade e a potenciação da saúde, ou seja, pessoas mais satisfeitas e felizes com a vida tendem a fazer uma maior potenciação da sua saúde.

6.

Finalmente, a última ideia a destacar neste estudo é que todos temos capacidade para sermos produtores de saúde. No indicador de potenciação da saúde situamo-nos no 6 (numa escala de 0,5 a 10). Contudo, 46% da população está abaixo desta média, sobretudo os mais novos, e 41% estão fora da classificação “vidas pró-saúde”.

A idade ainda é o grande “gatilho” de potenciação de saúde, o que significa que só começamos a atuar quando a perda começa. Numa sociedade envelhecida e onde os anos com saúde após os 65 estão abaixo da média europeia, começar esta potenciação de saúde mais cedo é um enorme desafio.

Além disso, quando entre os que reconhecem algum tipo de esforço para ser saudável (85%) a maioria o faz para “defesa” do bem-estar atual (66%) e não com o “drive” para ganhar saúde futura, tal significa que estamos a perder enormes oportunidades na conquista de uma melhor saúde individual e coletiva.

Leia o artigo completo na edição de julho/agosto 2021 (nº 318)