O que seria se eu não cuidasse da saúde durante o ano inteiro e estivesse preocupada apenas com a ceia de Natal? Se há uma rotina de estilo de vida que cuida da saúde, o organismo reconhece o que é a regra e o que é a exceção. A ceia de Natal pode ser a exceção!

Artigo da responsabilidade da Profª. Conceição Calhau. Investigadora e Professora Catedrática da Nova Medical School

 

A sazonalidade na alimentação, numa perspetiva de escolher consumir alimento que seja “‘local e sazonal”, parece-me sempre bem, pelo menos no possível, ainda que isso hoje também não seja bem assim: com as transformações agrícolas, a globalização do comércio alimentar e, ainda, as alterações do clima, os alimentos nem sempre têm o que pensamos que têm em matéria de micronutrientes e de fitoquímicos, por exemplo.

Mas, na realidade, há uma sazonalidade nos pedidos (pela procura, pela disponibilidade dos leitores) para o tema da alimentação: no Natal, sempre a questão de “como fazer dieta na época Natalícia”, como “fazer doces light”; tal como quando se aproxima a altura do biquíni, as ”dietas de verão”, entre outros temas que todos os leitores identificam.

Tenho recusado ano após ano escrever sobre estes temas, pois há que perceber: a saúde não padece de sazonalidade. Como já o disse e escrevi (eu e outros), a preocupação com a alimentação deve ser todo o ano, isto é, deve ser da passagem de ano ao Natal e não do Natal à passagem de ano.

NADA DE EXCESSOS

É evidente que com isto não estou a defender excessos – a dose faz o veneno, citando Paracelso – por isso, nada em excesso faz bem (talvez o amor, que desse, creio, quanto mais melhor).

Claramente, o excessivo tanto pode ser em quantidade como em qualidade. Dessa fala-se muito menos, quando falamos de “excessos”. Aliás, muito antes da quantidade, preocupa-me a qualidade!

Ainda continuo a ouvir falar em “calorias que como, calorias que vou ter de gastar no ginásio”. Como se o metabolismo funcionasse de acordo com as regras básicas da termodinâmica: calorias ingeridas, subtraindo as gastas, fico com as calorias que reservo. Muito pouco disto é verdade. Não funcionamos assim. A complexidade biológica não se resume a uma aritmética simples.

Voltando ao tema dos excessos na época Natalícia: a esta reflexão, considerei, desta vez, que seria uma boa oportunidade de colocar os pontos nos is.

QUAL CEIA LIGHT?!

Tenho sido muito clara no que toca ao “light”. Devemos ter comportamentos adequados e não viciados. Quando procuramos o “light“, diria que quase sempre está associada uma deturpação do conceito de alimentação saudável, pelo que este comportamento alimentar, em si mesmo, quase sempre me levanta preocupação.

Por outro lado, a formulação dos “lights” pode conter adoçantes não calóricos, emulsionantes que, em exposição crónica, sabemos fazerem mal à saúde. Ou seja, quando alguém descreve o dia alimentar e refere “queijo light”, “manteiga light”, “iogurte light”, “bolachas xpto sem glúten”, são pessoas que, generalizando, terão já uma má relação com a comida e, em regra, uma ideia errada do que faz bem ou faz mal. Isto aplica-se da mesma forma os que auguram fazer uma ceia de Natal “light” (muito a propósito do que escrevo no meu livro “A Ilusão da Comida Saudável”).

“Light” será comer de tudo um pouco, aliás, muito pouco. No Natal (ou noutra época ou momento de celebração), devemos é aproveitar o momento para o convívio pelo convívio e partilha de relações e não colocar este foco excessivo no menu!

A TÍPICA CEIA DE NATAL

Parecendo que este discurso é isotérico ou abstrato, vou tranquilizar o leitor sobre a típica ceia de Natal, que tem por base o bacalhau, as couves, o grão, a batata, o azeite, a broa de milho e, no final, o bolo-rei cheio de frutos secos.

Na realidade, depois de um prato com tudo isto, não sei se, no momento dos doces, terei assim tanta gula. Além de ter ficado bem saciada com o prato principal, rico em gordura monoinsaturada (azeite), ómega 3 (bacalhau), fibra, etc., não só será certo que terei menos “espaço” para a sobremesa, como também o impacto na glicemia (concentração de açúcar no sangue) será menor (que é bom que assim seja).

A canela tem sempre o seu lugar no que toca a doces conventuais ou não conventuais. Não esquecer que esta especiaria deve estar presente para baixar o índice glicémico (baixando o impacto na subida do açúcar no sangue). Na lista de sobremesas, não esquecer a romã, a laranja com canela ou outra fruta que pode ser servida em fatias polvilhadas de canela.

Leia o artigo completo na edição de dezembro 2024 (nº 355)