A disfagia é uma condição que altera profundamente a vida dos pacientes e daqueles que deles cuidam, transformando cada refeição numa experiência repleta de desafios, medos e frustrações.

Artigo da responsabilidade do Dr. Alexandre Bogalho. Psicólogo Clínico. Neuropsicólogo de Hospitais Privados.

 

A disfagia, condição caracterizada pela dificuldade em engolir, vai muito além de um simples problema físico. Para quem a enfrenta diretamente, a alimentação deixa de ser um momento de prazer e passa a ser um campo de batalha, onde o receio de engasgamento ou aspiração se mistura com a necessidade vital de ingerir alimentos e líquidos. Para os cuidadores, muitas vezes familiares próximos, a responsabilidade de garantir a segurança e o bem-estar do doente torna-se um peso emocional que não pode ser ignorado.

IMPACTO PROFUNDO E MULTIFACETADO

O impacto psicológico da disfagia nos pacientes é profundo e multifacetado. Comer e beber sempre foram atividades associadas ao prazer, à socialização e ao conforto emocional.

Quando esses momentos se tornam difíceis ou perigosos, o doente pode experimentar sentimentos de ansiedade, frustração e até vergonha. Muitos começam a evitar eventos sociais por receio de não conseguirem comer normalmente, afastando-se da família e dos amigos e, consequentemente, isolando-se. Esta quebra nas interações sociais pode agravar estados de ansiedade e depressão, especialmente se o paciente sentir que já não tem controlo sobre um ato tão básico da vida quotidiana.

Além disso, a dependência de terceiros para se alimentar pode gerar uma diminuição significativa da autoestima, levando à recusa de ajuda e até a quadros de desnutrição, quando a pessoa opta por comer menos para evitar situações embaraçosas ou difíceis.

SOBRECARGA EMOCIONAL DOS CUIDADORES

Os cuidadores também enfrentam uma carga emocional considerável. Para eles, a alimentação do doente torna-se uma preocupação diária, repleta de receios e incertezas. O medo constante de um engasgamento ou de uma infeção pulmonar provocada por aspiração aumenta os níveis de stress, transformando cada refeição num momento de tensão.

Paralelamente, muitos cuidadores sentem-se sozinhos na sua jornada, sem apoio suficiente ou sem a formação adequada para lidar com os desafios que a disfagia impõe.

A sobrecarga emocional e física pode levar ao esgotamento, sobretudo quando o cuidador abdica das suas próprias necessidades para se dedicar inteiramente ao bem-estar do paciente. A frustração e a culpa tornam-se sentimentos recorrentes, pois, apesar de todo o esforço, a condição do doente raramente melhora de forma significativa, e cada pequena vitória é acompanhada por novas dificuldades.

AUXÍLIO PROFISSIONAL

No meio destes desafios, a atuação dos profissionais de saúde é essencial para garantir não só a segurança alimentar do paciente, mas também a sua qualidade de vida emocional.

O terapeuta da fala desempenha um papel central na reabilitação da disfagia, ajudando os doentes a reaprender técnicas seguras de deglutição, adaptando a alimentação e proporcionando um acompanhamento que visa, não apenas o ato de comer, mas também a redução da ansiedade e o aumento da confiança durante as refeições.

Por outro lado, os profissionais de saúde devem estar atentos ao impacto psicológico da condição, oferecendo apoio emocional e encaminhamento para acompanhamento psicológico quando necessário. Um doente com disfagia não precisa apenas de um plano alimentar adequado, mas também de um suporte que lhe permita recuperar a autonomia e a dignidade na sua relação com a comida.

Os cuidadores, por sua vez, precisam de mais do que instruções médicas e dietéticas. O acesso a formações e recursos que os ensinem a lidar com a disfagia de forma prática e emocionalmente equilibrada é fundamental. Saber como preparar refeições adaptadas, como posicionar corretamente o doente para evitar complicações e, principalmente, como comunicar com empatia e paciência pode fazer toda a diferença.

Finalmente, é essencial que os cuidadores também cuidem de si próprios, procurando apoio em grupos de suporte, partilhando as suas dificuldades com outros na mesma situação e garantindo que não se anulam no processo de cuidar do outro.

Leia o artigo completo na edição de abril 2025 (nº 359)