Enquanto médica de família, contacto diariamente com doentes com hipercolesterolemia, isto é, níveis de colesterol elevado. São muitas as questões e ideias pré-concebidas sobre esta doença e o modo como deve ser abordada. E se as dúvidas são bastantes, os mitos são ainda mais, sendo a abordagem adequada adiada até ocorrerem complicações irreversíveis. No Dia de Sensibilização para a Hipercolesterolemia Familiar é ainda mais importante sensibilizar para esta doença prevalente.

Artigo da responsabilidade da Dra. Maria João Canelhas.  Coordenadora de Medicina Geral e Familiar no Hospital CUF Trindade

 

O colesterol elevado é um problema de saúde comum e um importante e silencioso fator de risco para doenças cardiovasculares, como o enfarte do miocárdio e o acidente vascular cerebral (AVC). O colesterol, por sua vez, é uma gordura essencial para o organismo, presente em todas as células. É produzido pelo fígado, mas pode ser proveniente da alimentação, em produtos de origem animal como carne, ovos, queijos e manteiga.

Que tipos de colesterol existem?

Existem três tipos de colesterol: o LDL (lipoproteína de baixa densidade), conhecido como “colesterol mau”, que, em excesso, se acumula nas paredes das artérias e forma placas que dificultam a passagem no sangue e podem levar à sua obstrução; o HDL (lipoproteína de alta densidade), também reconhecido como “colesterol bom”, que remove o excesso de colesterol LDL das artérias, transportando-o de volta para o fígado para ser eliminado; e os triglicerídeos, um outro tipo de gordura presente no sangue, frequentemente associado ao consumo excessivo de açúcares, álcool e alimentos processados.

O que justifica o colesterol elevado e como posso controlá-lo?

A hipercolesterolemia pode resultar de fatores genéticos, sedentarismo, excesso de peso, tabagismo ou doenças como a diabetes, sendo o diagnóstico realizado através de análises de sangue.

O primeiro passo é adotar um estilo de vida saudável, através de uma alimentação saudável, aumentando o consumo de fruta e legumes, gorduras saudáveis (azeite e os frutos secos) e reduzindo as gorduras saturadas (carnes gordas, enchidos, fritos). É também fundamental a prática de exercício físico regular (pelo menos 150 minutos de atividade moderada por semana), como caminhada rápida, natação ou bicicleta e cessação do consumo de álcool ou tabaco.

Se estas medidas não forem suficientes, ou perante um risco cardiovascular elevado, o médico pode prescrever medicação. Os principais medicamentos incluem as estatinas, para reduzir a produção de colesterol por parte do fígado, a ezetimiba, para diminuir a absorção de colesterol no intestino e os fibratos, que atuam principalmente na redução dos triglicerídeos.

Mitos sobre as estatinas

Muitos doentes acreditam que o benefício do tratamento não se sobrepõe ao risco, uma perceção alimentada por alguns mitos que vale a pena desmistificar.

“As estatinas fazem mais mal do que bem”

FALSO – As estatinas reduzem o risco de enfarte, AVC e morte cardiovascular. Os benefícios estão bem documentados.

“As estatinas causam efeitos secundários graves”

FALSO – O efeito secundário mais comum são dores musculares ligeiras, presente em poucos doentes.

“As estatinas não são seguras em idosos”

FALSO – Nos idosos, as estatinas são benéficas e seguras. A idade por si só não é uma contraindicação.

“As estatinas causam perda de memória”

FALSO – Não há evidência científica de que as estatinas causem demência. Podem mesmo ter um efeito protetor sobre o cérebro, ao melhorar a saúde dos vasos sanguíneos.

Realidade do “colesterol alto” em Portugal

Segundo um dos estudos nacionais mais recentes, 47% das pessoas apresentavam o colesterol total acima do valor de referência. Do mesmo modo, uma revisão concluiu que 60% da população adulta portuguesa tem colesterol total alto. No entanto, apenas 20% reconhece ou refere ter colesterol elevado.

Estes números revelam uma preocupante realidade: a hipercolesterolemia é frequente e subdiagnosticada em Portugal, sendo um fator de risco silencioso para doenças do coração e da circulação. É assim importante informar, para que não existam dúvidas sobre os problemas de saúde graves, mas evitáveis, que podem resultar do colesterol elevado não tratado. É ainda mais importante prevenir, mantendo um estilo de vida saudável, diagnosticar precocemente, e tratar, quando necessário.

Comece a tratar do seu coração hoje!