Avanços em Medicina são atitudes, técnicas e conhecimentos que permitem diagnósticos e tratamentos mais fáceis e com melhores resultados. Pouco importam grandes e complicados avanços que não se repercutem em tratamentos melhores, mais eficazes, mais duradouros e de mais fácil aplicação. Esses avanços são tão mais importantes quanto mais grave for a doença a que se dirigem, como é o cancro do pulmão.
Artigo da responsabilidade do Prof. Dr. José Alves. Pneumologista. Presidente da Fundação Portuguesa do Pulmão
Os últimos tempos foram marcados pela pandemia. A Pneumologia foi uma das participantes mais ativas neste problema mundial. Porém, sem o esquecer, gostaria de abordar, primeiramente, um outro problema, o cancro do pulmão, primeira causa de morte oncológica no mundo desenvolvido.
Por partes: até agora, era necessário obter tecido tumoral para o diagnóstico inicial. Continua a ser assim, mas – e este é um grande mas – a biópsia líquida permite a monitorização continuada dos resultados do tratamento, orientando a escolha de novos fármacos e aumentando, assim, o tempo e a qualidade de vida dos doentes.
FERRAMENTA NOVA E POTENTE
A biópsia líquida permite, com uma amostra de sangue, saber o que se passa com o cancro ou com metástases à distância. Deixa de ser necessário fazer exames invasivos, que obrigavam a internamento, a sofrimento e a efeitos secundários graves, ultrapassando problemas que, muitas vezes, eram inultrapassáveis.
O estudo destas amostras é um indicador de resposta ao tratamento, podendo ser prévio à imagem. Quer isto dizer que, até agora, era necessário esperar e procurar a evolução, com tomografia axial computorizada ou qualquer outro exame imagiológico; com este exame de sangue periférico, sabemos antecipadamente o que acontece com o tumor. Podemos modificar o tratamento de acordo com os resultados. Assistimos, assim, a sobrevidas com qualidade de vida até agora inéditas.
Não significa isto que não se procure os casos precocemente, não quer dizer que não se promova a evicção tabágica, quer dizer que a Pneumologia Oncológica tem agora uma ferramenta nova e potente que ajuda na doença oncológica, como nunca tinha acontecido. É um avanço significativo que traz novo e importante fôlego à luta antineoplásica.
MUDANÇA DE PARADIGMA
O diagnóstico passou a ter como parte integrante o diagnóstico genómico, além do diagnóstico histológico. Cada cancro passou a ser um caso particular, com individualidade específica e tratamento personalizado.
O paradigma do prognóstico mudou: enquanto, até ao momento, só os casos diagnosticados precocemente tinham sobrevidas aceitáveis, agora é possível tratar casos avançados com o mesmo resultado das doenças crónicas. O conceito de biópsia líquida, de rebiópsia e de resposta ao aparecimento de resistência tornou a Pneumologia Oncológica um campo de franca e positiva evolução.
O tratamento do cancro do pulmão também mudou recentemente com o aparecimento de fármacos específicos, que transformaram parte destes cancros em doenças crónicas. Falo da imunoterapia e das terapêuticas-alvo.
Também mudou a forma de entendermos, de forma rápida, as causas que levam alguns cancros a desenvolverem resistência aos tratamentos a que são sujeitos. Apareceu o conceito de que, como as bactérias, desenvolvem resistências às terapias instituídas. Este conceito surge com a possibilidade de estudar no sangue periférico as “proteínas” que são a assinatura da existência do cancro e das suas alterações. Tudo isto à distância de uma agulha, sem exames invasivos, broncoscopias, biópsias teciduais de execução difícil e consequências insuspeitadas.
É claro que, para que isto fosse possível, foi necessário muito trabalho, muito estudo simultâneo dos diferentes componentes sanguíneos, de maneira a identificar os oncológicos e, dentro destes, os que são importantes. O cancro do pulmão, o seu diagnóstico, o seu tratamento e os resultados são, quanto a mim, o que de mais significativo aconteceu nesta especialidade.
Leia o artigo completo na edição de maio 2022 (nº 327)
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