Os futuros pais e mães portugueses estão a ser “empurrados” para a parentalidade em idades cada vez tardias, onde a possibilidade de engravidar é cada vez menor e o acesso a tratamentos de fertilidade se torna cada vez mais limitado, alerta o Dr. Samuel Ribeiro, médico ginecologista e obstetra, especialista em Medicina da Reprodução.

“As políticas, até agora insuficientes, de promoção e proteção da parentalidade estão a conduzir-nos, pouco a pouco, à extinção. É, talvez, um exagero, dito desta forma, mas, se nada for feito, vamos ter um país envelhecido e com graves problemas sociais e económicos”, acrescenta.

Para o Dr. Samuel Ribeiro, o sistema deveria procurar ajudar e apoiar a planear a chegada dos filhos na melhor altura, ou seja, na idade em que as mulheres (e também os homens) são mais férteis. Mas, o que está a acontecer, de facto, é o “adiamento da maternidade e da paternidade” em busca de um ideal de estabilidade financeira e de carreira que na prática nunca chega. Sem querer, Portugal, assim como outros países europeus, enredou-se numa nova alteração climática – o inverno demográfico, afirma o médico.

“Várias razões contribuem para este declínio da taxa de natalidade, sendo um dos fatores-chave a mudança nos padrões sociais e económicos que levaram a uma redução das taxas de natalidade e ao envelhecimento da população. No seu conjunto, a proporção de idosos na população cresce, enquanto o número de jovens em idade reprodutiva diminui, criando desequilíbrio demográfico que sobrecarrega os sistemas de segurança social e de saúde, além de reduzir a força de trabalho disponível”, refere.

Além disso, o especialista sublinha que estudos recentes mostram que a qualidade do esperma dos homens a nível mundial diminuiu para metade nos últimos anos. Da mesma forma, há também evidência de que a reserva ovárica nas mulheres está a diminuir, o que pode dificultar a conceção, sobretudo quando associada a idades maternas mais avançadas. O pico de fertilidade na mulher situa-se entre os 20 e 25 anos. Após os 35 anos, a probabilidade de uma mulher engravidar naturalmente cai para metade.

“Se os estudos nos dão estes indicadores, temos de alterar as nossas políticas. Por exemplo, a contraceção é tendencialmente gratuita, enquanto os medicamentos que auxiliam os tratamentos de fertilidade, usados por curtos períodos e por uma minoria da população, têm uma comparticipação bastante inferior. Continua a ser muito limitado, no sistema público, o acesso à fertilização in vitro, à preservação de fertilidade ou à inseminação intrauterina com sémen doado, forçando as mulheres a procurar soluções no privado”, frisa o Dr. Samuel Ribeiro.

A seu ver, fazer face a este fenómeno que tem sido apelidado de inverno demográfico requer uma abordagem multifacetada que passa por políticas que apoiem a conciliação entre trabalho e vida familiar, como licença parental remunerada mais flexível e creches acessíveis que podem ajudar a incentivar os casais a terem filhos. Além disso, defende que “é necessário voltar a repensar no que significa planeamento familiar, procurando aumentar o investimento em educação e saúde reprodutiva e, consequentemente, a consciencialização sobre questões relacionadas à fertilidade e preservação da fertilidade”.