Os enormes progressos recentes na deteção e na terapêutica da fibrilhação auricular, que pode provocar o chamado AVC, vieram revolucionar a abordagem desta patologia. O tratamento tardio apresenta uma eficácia mais reduzida, pelo que o acompanhamento médico é essencial.
Artigo da responsabilidade do Dr. Luís Brandão. Cardiologista diferenciado em Arritmologia – Electrofisiologia Cardíaca nos hospitais CUF Tejo e CUF Descobertas
Em termos científicos, a fibrilhação auricular é uma arritmia em que as aurículas funcionam de forma rápida e irregular, levando a que o sangue não flua de forma eficiente para os ventrículos. Esta doença aumenta o risco de formação de coágulos, que podem migrar pela corrente sanguínea até ao cérebro, provocando o chamado acidente vascular cerebral (AVC) isquémico. É uma arritmia frequente, que afeta entre 2 a 4% da população mundial e está especialmente associada ao envelhecimento.
O diagnóstico da fibrilhação auricular é particularmente importante, uma vez que esta arritmia encurta a esperança média de vida, aumenta o risco de insuficiência cardíaca e é a causa por trás de 20 a 30% dos AVC isquémicos. Os sintomas mais habituais são sensação de coração acelerado ou irregular, cansaço fácil e dificuldade em respirar, mas em cerca de 20% dos casos pode ser assintomática – ou seja, não ter sintomas – e passar despercebida.
A fibrilhação auricular pode ser uma arritmia constante ou ocorrer de forma intermitente. O diagnóstico requer um eletrocardiograma ou um registo eletrocardiográfico prolongado, mas nas formas intermitentes pode ser difícil de detetar. É recomendada uma monitorização ativa para pessoas acima dos 65 anos ou com elevado risco de AVC, incluindo os doentes com hipertensão arterial, diabetes, doença coronária ou AVC prévio. As estratégias para esta monitorização incluem a avaliação ocasional da regularidade do pulso, a vigilância de pulsação irregular nas medições da pressão arterial ou a realização periódica de eletrocardiogramas.
Nos últimos anos, o desenvolvimento tecnológico trouxe-nos aplicações para telemóvel capazes de detetar arritmias, wearables e smartwatches que vieram permitir uma monitorização contínua e quase permanente do ritmo cardíaco de forma cómoda e largamente acessível, revelando-se excelentes ferramentas para a deteção precoce que poderão propiciar uma verdadeira “explosão” no diagnóstico da fibrilhação auricular.
O tratamento inicial da fibrilhação auricular envolve medicamentos para controlo da frequência cardíaca e, nos casos em que não existem contraindicações, anticoagulantes, para evitar a formação de coágulos. Na área dos medicamentos anticoagulantes, tradicionalmente temidos pelo risco de hemorragias, dispomos já de fármacos com grande eficácia e enorme segurança.
Dado que a fibrilhação auricular diminui a esperança e qualidade de vida e é causa importante de AVC, foram desenvolvidas opções terapêuticas para obter a cura da arritmia, através da destruição de células cardíacas específicas envolvidas na sua génese, com uma intervenção chamada ablação. Este tratamento pode ser realizado aplicando energia de radiofrequência (calor controlado) ou crioablação (frio extremo), através de uma veia, sem necessidade de cirurgia.
Recentemente, iniciou-se a ablação por “eletroporação” – com a utilização de energia eléctrica em pulsos de alta intensidade – que destrói o tecido de forma mais selectiva e é um tratamento mais rápido, sem efeito térmico e com menor risco de afetar as estruturas vizinhas, vindo simplificar e tornar ainda mais segura esta intervenção.
Nos casos de arritmia persistente, mais resistentes ao tratamento, a ablação orientada por inteligência artificial, em que as lesões criadas são adaptadas às necessidades individuais de cada paciente, revelou excelentes resultados preliminares, sendo uma técnica muito promissora a curto prazo.
Os enormes progressos recentes na deteção e na terapêutica da fibrilhação auricular vieram revolucionar a abordagem desta patologia. No entanto, o tratamento tardio apresenta uma eficácia mais reduzida, pelo que o acompanhamento médico diferenciado e regular é essencial, para garantir a deteção precoce da doença e uma seleção atempada do melhor tratamento, em cada caso.
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