Um estudo promovido pela MiGRA Portugal, Associação Portuguesa de Doentes com Enxaquecas e Cefaleias, vem revelar que existem dificuldades no acesso a consultas especializadas no Serviço Nacional de Saúde (SNS), o que acaba por levar muitos doentes com enxaquecas e cefaleias a procurar ajuda junto de instituições privadas.
Cerca de 40% dos doentes chegam mesmo a afirmar que não têm qualquer acompanhamento médico para estas patologias. A análise destaca ainda o facto de 60% não estarem satisfeitos com os tratamentos que fazem e uma larga maioria afirmar o desconhecimento dos novos tratamentos disponíveis.
Os dados do inquérito serão apresentados e debatidos esta tarde na conferência “O Acesso aos Cuidados de Saúde na Enxaqueca e Cefaleias”, a partir das 17h30, no Auditório da Associação Nacional das Farmácias, em Lisboa*, em parceria com a Sociedade Portuguesa de Cefaleias, a Sociedade Portuguesa de Neurologia, a European Migraine and Headache Alliance, a Associação Nacional de Farmácias e a Plataforma Saúde em Diálogo.
O estudo começa por fazer uma caracterização das pessoas inquiridas em que cerca de 40% dos inquiridos declaram que vivem com enxaqueca ou cefaleias há mais de 20 anos e 79% registam ter crises de mais de quatro dias por mês (14% mais de 14 dias e 5% diariamente).
No que diz respeito ao acesso a cuidados de saúde, cerca de 40% não têm qualquer tipo de acompanhamento médico e 54% das pessoas inquiridas procuram acompanhamento médico no privado. Por outro lado, o diagnóstico é também uma questão que se evidencia neste estudo, uma vez que cerca de 20% dos inquiridos revelam que visitam quatro ou mais médicos até chegarem à identificação da patologia, sublinhando-se ainda a dificuldade no acesso a consultas especializadas em cefaleias no SNS, o que acaba por levar muitas pessoas a procurarem ajuda junto das instituições privadas. A juntar a estes números, sobressaem dois dados relevantes: 38,5% dos inquiridos não possuem qualquer acompanhamento médico para estas doenças e 70%, com acompanhamento médico especializado, são acompanhados em instituições privadas.
A nível de tratamento, o estudo indica que 60% das pessoas não estão satisfeitas com o seu tratamento. Para além disso, e em termos de medicação, 55% não dispõem de conhecimento sobre o tratamento com toxina botulínica e 70% sobre o tratamento com medicamentos biológicos. Das pessoas inquiridas e que fazem tratamento preventivo, 30% só iniciaram este procedimento mais de cinco anos após o diagnóstico.
Como o fator financeiro não pode ser dissociado, o estudo da MiGRA Portugal analisou também o seu impacto ao nível da enxaqueca e das cefaleias. Assim, e mesmo que isso represente um maior esforço financeiro, conclui-se que as pessoas que não estão satisfeitas com o acesso aos cuidados de saúde, procuram soluções em unidades de saúde privadas – 25% referem que o valor da consulta é difícil de suportar e 20% dos inquiridos acompanhados no privado suportam a totalidade dos custos.
A apresentação dos resultados deste estudo aponta igualmente o rendimento médio dos doentes como não sendo compatível com o valor dos novos fármacos preventivos. Tendo em conta a dificuldade de acesso a consultas especializadas no SNS, assim como o número de doentes que é impelido para o setor privado, conclui-se que a maioria dos doentes não tem acesso aos medicamentos de que carece. Importa ainda referir que quanto mais baixo o rendimento, maior a percentagem de doentes sem acesso a consulta especializada e acompanhamento pelo Médico de Família.
O estudo “Acesso aos Cuidados de Saúde na Enxaqueca e Cefaleias” inquiriu 596 pessoas, onde se incluíram apenas pessoas com enxaqueca ou outras cefaleias. De salientar ainda que, desta amostra, 64% são beneficiários de um seguro ou plano de saúde. O objetivo foi caracterizar e conhecer melhor a realidade das pessoas que sofrem com enxaqueca e outras cefaleias, relativamente ao seu acompanhamento e acesso aos cuidados de saúde (consultas e tratamentos).
Enxaqueca e cefaleias
A enxaqueca é uma doença neurológica crónica que, atualmente, afeta mais de um milhão e meio de portugueses. No entanto, e apesar de envolver diversas esferas, nomeadamente pessoal, familiar e profissional, continua a ser uma doença subvalorizada, subdiagnosticada e subtratada, sendo, por isso, cada vez mais premente sensibilizar a comunidade para o impacto desta doença na vida dos doentes.
A relevância da enxaqueca no contexto das cefaleias deve-se à sua elevada prevalência, cerca de 12% da população mundial, e ao facto dos seus episódios serem habitualmente intensos e associados a incapacidade temporária, sendo que é considerada pela Organização Mundial de Saúde como a segunda doença mais incapacitante em termos de anos vividos com incapacidade. Se considerarmos a população abaixo dos 50 anos de idade, é a primeira causa de incapacidade.