São enormes os desafios que nos suscitam, não seria preciso falar tão somente em relação às pessoas com deficiência auditiva, mas também para a generalidade das pessoas com deficiências. Um desses desafios é, sem dúvida, o mercado laboral, no qual as pessoas com deficiência auditiva ainda encontram muitas barreiras.

Artigo da responsabilidade de Ricardo Miranda, Associação OUVIR

Cremos que o grande problema da sociedade civil global é entender que a perda auditiva é uma deficiência invisível e, ao contrário do que se refere normalmente, não interessa apenas falar mais alto.

A deficiência auditiva tem de ser tratada, tem de ser acompanhada e exige reabilitação. E como noutras deficiências, é necessária uma acessibilidade adequada. Na verdade, discute-se as formas de como persuadir o empregador ou o recrutador a escolher uma pessoa com uma deficiência, em detrimento de uma pessoa sem deficiência. E isso é recorrente, e muitas vezes injusto! Num processo de recrutamento, as pessoas com deficiência(s) estão em menor número, e ainda por cima, partem em desvantagem por terem exatamente a(s) sua(s) incapacidade(s).

Um processo de recrutamento exige uma entrevista e, antes disso, o candidato envia o seu CV. Começa aqui a incerteza e a insegurança. Por mais válida que seja a pessoa com deficiência e que esta pretenda concorrer, expor à partida a deficiência no CV (seja ela auditiva ou outra), pode ser alvo de discriminação ou exclusão por parte de quem está a selecionar.

Atualmente, vêem-se imensas campanhas e mensagens alusivas a este dogma, mas sendo ele/a recrutador ou empregador, quando tem um leque de candidatos, com e sem deficiência(s), como exigir que as pessoas com deficiência partem de igual modo? Para além disso, uma pessoa com surdez tem dificuldades em ouvir ao telefone, acompanhar uma conversa (sendo esta, online ou presencial), e logo de início parte em desvantagem perante os restantes candidatos.

Existem atualmente as chamadas quotas, que requerem que a empresa seja sensibilizada a contratar “algumas” pessoas com deficiência. Também existem medidas de incentivo à contratação de pessoas com deficiência, em que a empresa pode obter partido de benefícios fiscais. No entanto, todas estas medidas têm sido ineficazes e insuficientes!

Uma pessoa com deficiência auditiva pretende ser contratada contando com determinados princípios e “handicaps”. Exigir uma responsabilidade de carácter comercial, por exemplo, pode ser de uma tremenda dificuldade. Mas poderíamos falar também em trabalhar numa fábrica ou prestar um serviço de atendimento ao público presencial. Assim como trabalhar em ruído num open-space, já o cúmulo seria trabalhar num call-center, como muitas vezes vemos anunciado. No entanto, a pessoa com deficiência auditiva é alguém que pode assumir funções de carácter mais técnico, de trabalho mais minucioso, que exige maior concentração e rigor.

Depois poderíamos ainda afirmar que, em muitos empregos, a pessoa com deficiência ainda é vista como um “elemento escravo”, que é mal remunerado ou quando é selecionado o empregador, muitas vezes, exige que tenha uma remuneração inferior, no pressuposto que só nessa condição o possam escolher. E aqui somos muito críticos, pois se uma pessoa sem deficiência é paga em determinado valor, o esforço requerido por uma pessoa com deficiência é muito maior e, por isso, deveria ter uma compensação.

As pessoas com deficiência auditiva necessitam de ter recursos ao seu dispor, usar tecnologias assistivas: quando têm reunião ou para comunicação oral necessitam de legendagem; ou de um sistema FM ou sistema de Bluetooth, que emita o que é referido para os próprios dispositivos de apoio à escuta (aparelho ou processador de implante auditivo). Os sinais visuais, como iluminação, ecrãs, informação visual, são muito importantes. Não nos esqueçamos que, quando uma pessoa tem uma deficiência sensorial, os restantes sentidos são mais apurados e estes devem ser prevalecidos, como a visão em pessoas com deficiência auditiva.

Apesar dos ensinamentos deste artigo, a questão continua a pairar no ar: o que temos de fazer para que uma pessoa com deficiência (seja ela auditiva ou outra) seja contratada e quais os benefícios que uma empresa pode ter em contratar uma pessoa com deficiência? Quais as medidas? E na mobilidade, se uma pessoa com deficiência quiser assumir um desafio no estrangeiro? Aqui residem muitas questões e só podemos compreender que ainda há muito a fazer, apesar do tema da inclusão social ser cada vez mais debatido, e é neste tema que as entidades governamentais deverão focar-se mais.

É um problema na atualidade, que cada vez mais pessoas com deficiência encontram-se desempregadas à procura de uma oportunidade digna, e que lhes garanta o futuro, com menos dependência do Estado. Mas existirá motivação e vontade para isso?