O treino das competências sociais é um tipo de intervenção que promove a compreensão e aquisição de comportamentos cada vez mais funcionais nas pessoas com síndrome de Asperger.

Artigo da responsabilidade da Dra. Patrícia de Sousa, Psicóloga da área do Neurodesenvolvimento, Diretora Técnica da Casa Grande da APSA-Associação Portuguesa de Síndrome de Asperger

 

0 Patricia de SousaEnfatizando toda a sintomatologia ao nível do comportamento social, designadamente a ausência de empatia, uma interação ingénua, inadequada e, muitas vezes, unilateral, a ausência ou dificuldade em estabelecer amizades, um discurso eloquente, mas repetitivo, uma comunicação não-verbal pobre, um interesse consistente por determinados temas, a fraca coordenação motora e postura desajeitada, evidenciando uma marcante e peculiar forma “de estar” e de “atuar”, falo-vos da intervenção ao nível das competências sociais nas Perturbações do Espectro do Autismo (PEA).

A síndrome de Asperger (SA) está, hoje em dia, enquadrada nas PEA. Os sinais e sintomas enquadram-se num perfil peculiar ao longo do desenvolvimento da criança, exigindo um acompanhamento e uma intervenção que valorizem e se centrem no seu próprio contexto, promovendo um ganho de competências facilitadoras para as suas aprendizagens a nível académico e social, bem como na promoção da própria autonomia e inserção na sociedade.

PERCEBER A SINTOMATOLOGIA

Perceber a sintomatologia e intervir na SA tem sido um desafio e um investimento que nos levanta inquietudes ao nível do próprio indivíduo e sua integração no meio.

Deparamo-nos com uma associação vasta e diferenciada de sintomas, que na sua aparência nada têm em comum. No decorrer do tempo, por vezes, torna-se evidente a associação de sinais e sintomas que estão frequentemente ligados a outras patologias, que em nada favorecem o seu prognóstico.

Existem comorbilidades, por vezes, com prejuízo em áreas específicas da cognição verbal ou não verbal, que poderão hipotecar determinadas generalizações de conceitos e, automaticamente, serão geradoras de perdas ao nível da progressão para uma autonomia mais eficaz.

Muitas crianças com PEA apresentam perturbações específicas da linguagem, as mais comuns associadas à fraca semântica, mas sabemos que existem Perturbações de Linguagem graves ao nível da linguagem expressiva e/ou compreensiva. O que nos levanta algumas limitações onde, a meu entender, não são mais do que desafios que temos pela frente na adequação das metodologias a desenvolver no decorrer da intervenção.

As Perturbações de Hiperatividade, com um perfil dominante ao nível da impulsividade, ou mesmo os Défices de Atenção, são potenciais parcerias das PEA, exigindo uma observação e avaliação sistematizadas para que haja sucesso farmacológico e que este sirva de sustentação para uma intervenção mais facilitadora.

Com a adolescência e a transição para a vida adulta, numa vertente mais psiquiátrica, podem ser despoletados padrões depressivos, perturbações de ansiedade, perturbações obsessivo-compulsivas, entre outras. Apresenta-se, assim, um quadro sintomatológico mais complexo, privando o jovem/adulto de uma integração plena (apesar de diferenciada).

Nesta perspetiva, é de valorizar a existência de outras patologias associadas como promotoras de um desinvestimento no ganho de competências a longo prazo.

TREINO DAS COMPETÊNCIAS SOCIAIS

A Competência Social é a área do desenvolvimento pessoal e social que permite a concretização de relações intra e interpessoais satisfatórias, através de comportamentos verbais, não-verbais e aspetos cognitivos.

Com o treino das competências sociais investimos na interação social, na área da comunicação e na capacidade de imaginação/flexibilização da criança, remetendo-nos para uma intervenção que promove a compreensão e aquisição de comportamentos cada vez mais funcionais.

O objetivo prioritário centra-se na aprendizagem sistematizada e concretizada para uma compreensão e adequação comportamental nos diferentes contextos sociais, para que a criança/jovem não sejam estigmatizados. É necessário que a criança faça o conhecimento e a aplicação de diferentes conceitos, o entendimento de que existem diferentes formas de comunicar e de se expressar. Só assim facilitamos o processo para uma melhor integração, fazendo com que a criança se avalie como um agente ativo e desencadeie atitudes facilitadoras de comportamentos tão banais como a realização de uma conversa, a aceitação de um convite, dar uma opinião de forma assertiva, ter a capacidade de realizar um recado, atravessar uma estrada, de fazer uma compra, andar num transporte público, enfim…. beneficiar de um dia-a-dia repleto de vivências.

A Intencionalidade Comunicativa, a Regulação Emocional e a Reciprocidade Social determinam os objetivos específicos a desenvolver na intervenção com a família, escola e, agentes sociais em cada contexto da vida da pessoa com SA.

O nosso papel passa por estruturar, intervir e mediar uma rede de contextos e pessoas em função da vida ativa da pessoa com SA, promovendo uma melhoria da sua compreensão pessoal e social para que a funcionalidade de hoje promova a verdadeira integração de amanhã.

Artigo publicado na edição de março 2016 (nº 259)