Crónica, progressiva e sem cura conhecida, a doença de obesidade instala-se silenciosamente nos indivíduos. Existem alguns tratamentos, como a cirurgia da obesidade, mas nenhuma solução é absolutamente infalível.

Artigo da responsabilidade do Prof. Dr. Gil Faria. Cirurgião especialista em Cirurgia da Obesidade e Metabolismo. Coordenador dos Centros de Tratamento da Obesidade do Hospital Pedro Hispano, em Matosinhos, e do Grupo Trofa Saúde. Professor da FMUP

 

É frequente chegarem-me doentes à consulta com esta preocupação. Alguns anos após uma cirurgia da obesidade, cerca de 10 a 20% dos doentes poderá apresentar uma significativa recuperação de peso. Este ganho, após a cirurgia, constitui não uma falência do tratamento, mas sim uma evolução de uma doença que, cada vez mais, entendemos como crónica.

A obesidade é uma patologia crónica, progressiva e sem cura conhecida. É possível controlá-la com excelentes resultados (a forma mais eficaz é a cirurgia), durante longos períodos, mas não existem tratamentos absolutamente infalíveis.

O organismo humano está geneticamente programado para a conservação de energia, que é um mecanismo fundamental para a sobrevivência. Desta forma, existem vários sistemas de controlo associados ao equilíbrio energético que o organismo exprime através da fome, da saciedade, da medição da adiposidade e da regulação do gasto energético. Após uma cirurgia da obesidade, vai acontecer uma “normalização” de alguns destes circuitos, nomeadamente dos sistemas associados à fome e à saciedade. Depois da intervenção, os indivíduos têm menos fome e ficam saciados com uma menor quantidade de alimentos. E isto não é importante, apenas porque permite comer menos, mas sobretudo porque faz com que o organismo “sinta” que comeu bastante. Esta diferença entre o consumo “real” e o consumo “assumido” pelo organismo é o que vai permitir a perda de peso.

No entanto, passado algum tempo, o corpo vai acomodar esta diferença e vão entrar em ação outros mecanismos de controlo associados à conservação de energia. Desta forma, é normal que 18-24 meses após a cirurgia exista alguma (ligeira) recuperação de peso.

Em alguns indivíduos (com distúrbios metabólicos mais “graves” ou com menor compromisso com as necessárias alterações de estilo de vida, que passam essencialmente pela dieta e exercício físico), esta recuperação de peso pode atingir valores bastante mais significativos, o que não é sinónimo de que o tratamento tenha falhado (apenas houve uma progressão da doença), ou que não existam outras alternativas de terapia.

O sucesso do tratamento da obesidade depende, pois, de uma equipa multidisciplinar e não se esgota numa intervenção cirúrgica. Um acompanhamento continuado, antes e após a cirurgia, é fundamental para garantir a eficácia, mas também para permitir que, em caso de progressão da obesidade, possam ser apresentadas as melhores alternativas de tratamento complementar, que podem passar por apoio nutricional, psicológico, comportamental, farmacológico ou, eventualmente, cirúrgico.

Com tudo isto, a cirurgia da obesidade não é uma solução milagrosa eterna, mas, felizmente, também não existem casos perdidos!