No âmbito do Concurso CaixaResearch Validate, a Fundação selecionou 15 projetos inovadores, quatro deles portugueses, que receberão um apoio financeiro de até 100 000 euros e formação especializada em áreas-chave, como a transferência de tecnologia e a comercialização.

Um painel de especialistas europeus e profissionais da área das ciências da vida e da saúde selecionou estes 15 projetos de entre 110 apresentados a concurso. Os selecionados recebem até 100 000 euros do Programa para validar a sua tecnologia e elaborar um roteiro para a sua valorização.

Nas palavras do Diretor Corporativo de Investigação e Saúde, Àngel Font: «Com este concurso de apoio queremos eliminar a barreira que existe entre o laboratório e o mercado, acrescentando valor ao conhecimento científico criado por investigadores da Península Ibérica e aproximando, através de financiamento e assessoria, as suas inovações de quem mais as aguardam: os doentes».

Avançar com recursos económicos e de formação

Para além do apoio financeiro, os investigadores já começaram a receber formação especializada em áreas-chave para o desenvolvimento do seu ativo. Nas primeiras semanas de formação, estabeleceram os primeiros contactos com os mentores e grupos de especialistas associados ao Programa, de quem receberam informação sobre transferência de tecnologia, ferramentas para melhorar o seu plano de valorização, desenvolvimento dos produtos, legislação relativa a propriedade intelectual e sobre apresentação a investidores, entre outros temas.

Nos próximos meses, continuarão a receber formação sobre aspetos como a negociação e celebração de acordos, ou o encontro com investidores importantes da área da saúde e das ciências da vida e a receção do seu feedback, para além de adquirir conhecimentos básicos sobre finanças. Além disso, serão acompanhados por mentores que lhe prestarão assessoria durante a elaboração dos planos de valorização e comercialização, bem como durante todo o desenvolvimento do Programa, a fim de garantir a supervisão ativa dos projetos e orientar a evolução dos mesmos.

OS QUATRO PROJETOS PORTUGUESES SELECIONADOS

Melhorar a eficácia dos tratamentos contra o cancro reduzindo a sua toxicidade
Investigador: Diogo Magalhães e Silva, Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa

O cancro continua a ser uma das principais causas de morte em todo o mundo. Só em 2020, registaram-se 19,3 milhões de novos casos e cerca de 10 milhões de mortes relacionadas com o cancro. Embora nos últimos anos se tenham desenvolvido novas tecnologias de tratamento e fármacos muito eficazes, estes continuam a não estar direcionados seletivamente para as células cancerosas.

Por esta razão, os doentes enfrentam inúmeros efeitos secundários, incluindo perda de cabelo e dentição, náuseas, tonturas, vómitos, imunossupressão e até a possibilidade de ter de interromper o tratamento devido precisamente a esses efeitos secundários, o que compromete gravemente as perspetivas de sobrevivência dos doentes.

Com o objetivo de ultrapassar esta dificuldade, mediante a descoberta de moléculas com um elevado potencial seletivo que se dirijam exclusivamente aos tumores, os investigadores concentraram-se numa característica intrínseca do cancro para desenvolver um sistema de administração do fármaco que se ative seletivamente no interior dos tumores. Concretamente, aproveitaram a singularidade do metabolismo do ferro, que, quando se altera, se considera um marcador oncológico. Está presente em muitos cancros, como o do pulmão, o da mama, o da próstata, o pancreático e o colorretal, que, juntos, representam mais de 50% da mortalidade por cancro.

Neste projeto, os investigadores procuram validar uma nova terapia dirigida ao metabolismo do ferro para reduzir os efeitos secundários do tratamento do cancro colorretal. Se for bem sucedida, abrir-se-á a porta a um novo sistema de administração da quimioterapia dirigida à assinatura metabólica das células tumorais, o que poderia reduzir a toxicidade inespecífica nos tecidos saudáveis e melhorar a esperança e qualidade de vida dos doentes oncológicos.

Nanopartículas para controlar a Helicobacter pylori sem utilizar antibióticos
Investigadora: Paula Parreira, Instituto Nacional de Engenharia Biomédica (INEB)

A Helicobacter pylori, uma bactéria em forma de espiral que cresce na camada mucosa que reveste o interior do estômago, coexiste com os seres humanos há milhares de anos. Com efeito, estima-se que aproximadamente 50% das pessoas tenham a Helicobacter pylori no organismo. Embora a bactéria não costume causar problemas à maioria dos indivíduos infetados, é diretamente responsável por 90% dos cancros gástricos no mundo, com cerca de 1 milhão de novos casos por ano.

Este tipo de cancro, o do estômago, é muito difícil de prevenir, uma vez que não existem biomarcadores específicos e não se conhecem sintomas precoces de alerta. Por conseguinte, erradicar esta bactéria reduziria em grande medida a incidência da doença.
As orientações na área da saúde aconselham a erradicação da H. pylori em todas as pessoas infetadas. No entanto, isso implica o uso maciço de antibióticos, concretamente, uma combinação de dois ou três tipos diferentes. Esta estratégia, contudo, não funciona em quatro em cada dez doentes, principalmente porque a bactéria desenvolveu resistência aos antibióticos. Isso significa que cerca de 1,6 milhões de pessoas em todo o mundo ficam sem opções para eliminar a infeção.

Por outro lado, o uso repetido e maciço de antibióticos, e a má utilização dos mesmos, também altera a microbiota intestinal normal do hóspede, o que pode gerar outros problemas de saúde.

Em resposta a esta situação, os investigadores desenvolveram o NanoPyl®, que consiste numa fórmula de nanopartículas lipídicas concebida para controlar a carga de H. pylori por administração oral. O NanoPyl® reduz de forma segura e eficaz a carga de H. pylori na microbiota gástrica, permitindo, ao mesmo tempo, manter saudável a mucosa intestinal do hóspede. Ao contrário dos antibióticos, o NanoPyl® não induz resistência bacteriana e não altera a microbiota intestinal do hóspede. Num ensaio de 14 dias de duração em modelos animais, o NanoPyl® reduziu 90% da carga gástrica de H. pylori.

Medicina personalizada para reparar lesões dos nervos periféricos
Investigador: Jorge Fernando Jordão Coelho, Instituto Pedro Nunes – Associação para a Inovação e Desenvolvimento em Ciência e Tecnologia. Projeto em consórcio com a Universidade de Coimbra

Os nervos periféricos enviam mensagens do cérebro e da espinal medula ao resto do corpo. Também recolhem informação sensorial para o sistema nervoso central. Por exemplo, são responsáveis por movermos os músculos para andar e por sentirmos que as mãos estão frias. Na Europa, cerca de 300 000 pessoas por ano sofrem algum tipo de lesão que danifica os nervos periféricos, com um grande impacto na sua qualidade de vida, além dos elevados custos socioeconómicos. Só nos Estados Unidos, o custo destas lesões foi estimado em cerca de 7000 milhões de dólares por ano.

Um dos tratamentos mais promissores para reparar os nervos danificados consiste no uso de um tubo-guia (NGC, na sigla em inglês), um tipo de enxerto nervoso artificial que permite voltar a unir segmentos danificados dos nervos periféricos e que promove e acelera a sua autorregeneração. Todavia, os NGC desenvolvidos até agora apresentam limitações em termos de degradabilidade, biocompatibilidade e flexibilidade, derivadas dos polímeros utilizados e do processo de fabrico.

Para ultrapassar esta limitação, os investigadores utilizam outro tipo de polímero, o dextrano, que permite melhorar a biodegradabilidade e a biocompatibilidade. Também utilizam o PCL devido às suas propriedades mecânicas, uma vez que permite que os nervos se regenerem adequadamente. Este novo polímero já foi testado com sucesso em modelos animais (ratos) com danos no nervo ciático e foram obtidos resultados promissores. Neste projeto, o objetivo consiste em desenvolver uma tecnologia de impressão 3D de NGC baseados em dextrano e PCL para fabricar nervos adaptados a cada doente. Mais um passo em direção à medicina personalizada.

GO-Graft – Enxerto vascular sintético para o bypass da artéria coronária
Investigadora: Andreia Pereira, Instituto Nacional de Engenharia Biomédica (INEB)

As doenças cardiovasculares são a principal causa de morte em todo o mundo e, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), são responsáveis por 18 milhões de mortes todos os anos. Neste grupo de patologias, a doença arterial coronária (DAC) ou cardiopatia isquémica, que provoca os enfartes, afeta 335 milhões de pessoas em todo o mundo. A DAC ocorre quando os vasos sanguíneos que irrigam o coração estão danificados ou bloqueados, normalmente por placas de colesterol nas artérias.

Os tratamentos disponíveis para as pessoas que sofrem de DAC consistem em medicação ou na reabertura mediante stents dos vasos bloqueados para restabelecer o fluxo sanguíneo. Nos casos mais graves, que representam aproximadamente 1% dos doentes, é necessária uma cirurgia para substituir os vasos danificados. A norma de ouro consiste em utilizar vasos sanguíneos de outras partes do corpo do próprio doente, o denominado enxerto autólogo. Contudo, os enxertos autólogos nem sempre estão disponíveis e esta opção comporta uma série de complicações, como sejam várias intervenções cirúrgicas para extrair os vasos e implantá-los, bem como a possibilidade de infeções associadas.

Também existem os enxertos sintéticos, que têm bons resultados na substituição de vasos de diâmetro médio e grande. No entanto, no caso dos vasos pequenos, como as artérias coronárias, costumam favorecer a formação de trombos.

Em resposta a estas limitações, os investigadores desenvolveram o GO-Graft, o primeiro enxerto vascular sintético antiaderente de pequeno diâmetro para o bypass das artérias coronárias. Fabricado a partir de um hidrogel reforçado mecanicamente com óxido de grafeno, previne a trombose e evita a adesão de bactérias.