Uma equipa científica liderada pela Profª Teresa Gonçalves, da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, vai investigar a interação entre os microrganismos que habitam o nosso intestino e os recetores de adenosina, onde pode estar a chave para tratar várias doenças, entre as quais a obesidade.

O projeto de investigação “Mycobiota homeostasis under the regulation of adenosine receptors as pivotal players in obesity”, de uma equipa liderada pela investigadora Teresa Gonçalves*, da Faculdade de Medicina de Coimbra, foi o vencedor da 3.ª edição da Bolsa Nacional para Projetos de Investigação, atribuída pela Biocodex Microbiota Foundation. O estudo, financiado com um prémio de 25 mil euros, será desenvolvido ao longo de ano e meio e poderá encontrar novos alvos terapêuticos não só para a obesidade, como para as doenças a ela associadas.

Segundo a investigadora, há cada vez mais evidências a sustentar que os microrganismos que vivem no nosso intestino (microbiota) contribuem para a nossa saúde. O que não se conhece com maior profundidade é como é regulado este conjunto de microrganismos. “Este projeto pretende descobrir se um dos controladores pode ser o sistema de modulação operado pela adenosina, cuja manipulação controlaria a microbiota intestinal para prevenir ou mitigar a obesidade”, explica.

Teresa Gonçalves sublinha que a obesidade e as doenças associadas são doenças complexas com causas diversificadas e de difícil tratamento. Para além dos fatores genéticos e pessoais, como a qualidade da alimentação ou o exercício físico, existem outros fatores que podem contribuir para estas patologias. Um desses fatores é a população de microrganismos do intestino – a microbiota intestinal – essencial para definir como processamos os alimentos ingeridos.

A maioria dos estudos sobre microbiota intestinal têm-se focado nas bactérias do intestino. Já as populações de fungos (micobiota**) que também fazem parte da microbiota intestinal têm sido menos estudadas, embora haja já alguns dados sobre a sua influência em doenças crónicas, como a obesidade, a diabetes ou doenças inflamatórias. “A interação da microbiota com o nosso organismo envolve recetores na superfície das células de cada indivíduo, que podem estar na origem de algumas destas morbilidades. Esta interação pode levar ao agravamento ou, pelo contrário, à melhoria dos sintomas”, refere a investigadora principal do Centro de Neurociências e Biologia Celular da Universidade de Coimbra e da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra.

Entre esses recetores estão os recetores de adenosina que, entre outras funções, podem, segundo acredita a equipa científica, ser capazes de controlar a micobiota intestinal no idoso. Os recetores de adenosina (A2A e A2B) são como que sensores que existem em todas as células humanas para identificar sinais de stress ou esforço – a adenosina. Estes recetores têm particular importância no controlo da inflamação, prevenindo o dano excessivo de tecidos. Estes sensores podem também contribuir para o controlo da obesidade.

“O que iremos definir é o papel destes sensores no processo de inflamação e se, através deles podemos equilibrar a microbiota e, consequentemente, a inflamação. E, desta forma, promover uma normalização do metabolismo intestinal e, ao mesmo tempo, prevenir a obesidade”, esclarece a investigadora.

O tema escolhido para os projetos candidatos à edição 2021/2022 da Bolsa Nacional para Projetos de Investigação foi a “Microbiota e ABCD – Doença Crónica Baseada na Adiposidade”. Os projetos foram avaliados por um júri independente constituído pelos quatro membros do Comité Científico da Biocodex Microbiota Foundation em Portugal, que escolheram o trabalho da equipa liderada pela investigadora Teresa Gonçalves.

No ano passado foi vencedor o projeto PRIMING, que tem como objetivo compreender o impacto da obesidade materna na ativação e estimulação do sistema imunitário da criança induzido pela microbiota intestinal ao longo do primeiro ano de vida, da autoria de uma equipa de investigadores do i3S – Instituto de Investigação e Inovação em Saúde da Universidade do Porto. Na primeira edição, a Bolsa foi atribuída a uma investigação que visava a identificação de perfis específicos de microbiota e metabolitos que pudessem prever melhores terapêuticas para os doentes com Espondilartrite (SpA) e a Artrite Reumatoide (AR), de dois investigadores da NOVA Medical School | Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa.

*Teresa Gonçalves é professora associada e diretora do Instituto de Microbiologia da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra. É investigadora principal do Centro de Neurociências e Biologia Celular, um instituto de investigação de biociências e biomedicina da Universidade de Coimbra.

**Microbiota e Micobiota – A microbiota humana corresponde a todos os microrganismos que colonizam o nosso organismo e com os quais convivemos diariamente: bactérias, vírus, fungos, leveduras e protozoários. A sua composição difere de acordo com as superfícies colonizadas, ou seja, existe a microbiota cutânea, a vaginal, a urinária, a respiratória, a da cavidade oral e a microbiota intestinal, anteriormente denominada como flora intestinal. A micobiota é a componente fúngica da microbiota.

Da esquerda para a direita: Ermelindo Leal, Eugénia Carvalho, Teresa Gonçalves, Rodrigo Cunha, André Lázaro, Lisa Rodrigues.