Cerca de 88% das mulheres portuguesas sexualmente ativas conhece a pílula de emergência e 17% afirma já ter utilizado. Esta é uma das muitas conclusões do maior estudo de sempre realizado em portugal na área da contraceção feminina, as quais são aqui analisadas.

1 Dra. Fernanda Águas SPGArtigo da responsabilidade da Dra. Fernanda Águas, Presidente da Sociedade Portuguesa de Ginecologia

Foi apresentado no passado mês de Junho, por ocasião do XIII Congresso Português de Ginecologia, o estudo sobre avaliação das práticas contracetivas em Portugal, uma iniciativa das Sociedades Portuguesas de Ginecologia e da Contraceção, que teve como objetivo principal conhecer as opções contracetivas das mulheres residentes em Portugal, avaliar o conhecimento dessas mulheres sobre os métodos contracetivos disponíveis, caracterizar as suas expetativas face à contraceção e, finalmente, avaliar o impacto do uso de contraceção na qualidade de vida. Pretendeu-se, ao mesmo tempo, fazer uma comparação entre as práticas contracetivas atuais da população portuguesa com os resultados encontrados no estudo anterior, realizado pela Sociedade Portuguesa de Ginecologia, em 2005.

Durante este período de 10 anos surgiram novas formulações para contraceção e tiveram lugar alterações legislativas suscetíveis de influenciar os comportamentos no que respeita à saúde sexual e reprodutiva, nomeadamente a possibilidade da aquisição de contraceção de emergência fora das farmácias, a despenalização da interrupção voluntária da gravidez a pedido da mulher, a elaboração do programa Nacional de Saúde Reprodutiva e, também, a obrigatoriedade de instituir a Educação Sexual em meio escolar.

O estudo sobre avaliação das práticas contracetivas incluiu uma amostra, estratificada por Região e idade, representativa da população do sexo feminino, em Portugal, com idades compreendidas entre os 15 e os 49 anos, a quem foi aplicado um questionário, de um modo presencial e anónimo.

MAIOR CONSCIENCIALIZAÇÃO

Os resultados obtidos mostraram que cerca de 94% das mulheres portuguesas sexualmente ativas utilizam um método contracetivo, o que representa um aumento de 12% de uso de contraceção, comparativamente com os dados encontrados no inquérito realizado em 2005.

Este aumento de utilização foi também significativo no grupo das adolescentes, facto que é de enaltecer e traduz a consciencialização das jovens sexualmente ativas sobre os riscos de uma gravidez na adolescência. No inquérito realizado em 2005, 30% das adolescentes sexualmente ativas não utilizava contraceção e, em 2015, este número reduziu para 6 por cento.

Gráfico 1 – Uso actual de um método contracetivo por idades

VIAS DE ACESSO À INFORMAÇÃO

O acesso à informação sobre contraceção diversificou-se largamente nos últimos 10 anos, com especial destaque para os meios digitais, sendo a internet a fonte de informação preferencial, sobretudo nos grupos etários inferiores a 40 anos. Contudo, esta nova realidade não obsta a que tenhamos constatado, pelas respostas ao questionário, que o médico continue a ser o profissional de saúde com papel preponderante no aconselhamento contracetivo.

Gráfico 2 – Onde procura informação sobre contraceção?

 2005 (%) 2015 (%)
Médico de Família33,752,0
Ginecologista63,332,4
Parceiro56,37,2
Pais/familiares25,611,3
Colegas/amigos27,5/61,121,0
Enfermeiro4,414,9
Farmacêutico3,49,1
Internet29,6
Outros3,54,6

 

Relativamente à vigilância, verificamos que 60% das mulheres inquiridas tinha tido uma consulta de Planeamento Familiar no último ano, o que poderá traduzir alguns problemas de acessibilidade a estas consultas.

A análise por grupo etário mostra diferenças significativas, sendo que as jovens têm uma frequência muito inferior de consultas de Planeamento Familiar ou de Ginecologia, realizadas no último ano. Haverá nesta área iniciativas a desenvolver, nomeadamente com a criação e/ou alargamento de consultas especificas para esta faixa etária.

birth controlMÉTODOS PREFERIDOS

A pílula continua a ser o método contracetivo preferencialmente utilizado pelas mulheres portuguesas, embora o seu uso tenha descido de 62% em 2005 para 58% em 2015. Tal como esperado, as novas formas de administração dos estroprogestativos (hormonas que compõem a pílula), em adesivo de aplicação cutânea ou anel vaginal, passaram a ter uma maior taxa de utilização.

O uso do preservativo masculino manteve-se estável comparativamente com o que tinha sido observado em 2005. Considerado isoladamente, o preservativo masculino foi o segundo método contracetivo mais utilizado, por 14% das mulheres; e cerca de 80% dos casais que adota este método considera em paralelo a proteção face às infeções sexualmente transmissíveis, o que traduz uma maior a consciencialização também nesta matéria. A utilização dos dois métodos em simultâneo (pílula e preservativo) tem maior expressão nos grupos etários dos 15 aos 19 anos e dos 20 aos 29 anos (24%).

Verificou-se, ainda, ao longo destes 10 anos, um aumento da preferência por métodos contracetivos menos dependentes da utilizadora, tais como o dispositivo intrauterino de cobre /sistema intrauterino com levonorgestrel (dispositivo intrauterino hormonal) ou o implante subcutâneo.

Gráfico 3 – Contraceção utilizada

 2005 (%)2015 (%)
Pílula (qualquer tipo) 62,058,1
Outro método + Preserv. 7,8 7,9
Anel vaginal0,12,7
Adesivo / Selo0,43,0
Implante subcutâneo1,15,4
DIU /SIU11,511,8
Injeção0,5
Preservativo masculino14,414,3
Preservativo feminino0,00,0
Métodos naturais2,00,7
Coito interrompido0,7
Laqueação de trompas4,62,6
Outro0,10,0

 

Contraception  féminine - StériletBENEFÍCIOS ADICIONAIS

A análise por grupo etário mostra diferenças significativas no método contracetivo utilizado. Nos jovens com menos de 19 anos, destaca-se a utilização do preservativo; no grupo dos 30 aos 39 anos, predomina a opção pela pílula; e o grupo dos 40 aos 49 é aquele em que é mais utilizado o dispositivo intrauterino (com cobre ou hormonal). A opção por este método nas mulheres mais velhas poderá ter a ver, em alguns casos, com a associação destes métodos a indicações terapêuticas, nomeadamente para tratamento das perturbações do ciclo menstrual, frequentes nesta fase da vida (dispositivo intrauterino hormonal).

No que concerne à pílula contracetiva, mantêm os problemas de má utilização, pois 22% das mulheres inquiridas admitem que se esquecem de a tomar, todos os ciclos ou mais de uma vez por mês. No que diz respeito ao esquecimento relativamente à toma da pílula por grupo etário, este é mais frequente nas mulheres mais jovens. Também neste aspeto haverá que consciencializar as mulheres que as falhas atribuídas à pílula são maioritariamente por má utilização e que nos casos em que não seja possível ultrapassar estas dificuldades haverá que procurar outras soluções.

Por outro lado, 88% das mulheres sexualmente ativas conhece a pílula de emergência e 17% afirma já ter utilizado. As mulheres sexualmente ativas que já recorreram a esta contraceção de emergência situam-se nos grupos etários dos 20 aos 29 anos e dos 30 aos 39 anos, 41% e 43% respetivamente.

Finalmente, e porque muitos métodos apresentam efeitos benéficos adicionais à contraceção, considerou-se importante incluir neste inquérito uma avaliação desse aspeto, tendo-se verificado que o uso de contraceção teve repercussões positivas na qualidade de vida em 81% das mulheres. Para além da segurança contracetiva, os benefícios adicionais que as mulheres mais valorizam incidem sobre o controlo do padrão menstrual.

Gráfico 4 – O uso de contraceção melhorou a sua qualidade de vida? Se sim, porquê?

 (%)
Está segura na prevenção da gravidez96,5
Melhorou das dores menstruais16,5
Tem ciclos menstruais regulares22,2
Não tem menstruação3,8
Melhorou a acne4,9
Reduziu o crescimento dos pelos2,7
Outra2,6

 

Principais conclusões a reter deste estudo

  • Usam contraceção 94% da mulheres sexualmente ativas;
  • 70% das adolescentes teve acesso a educação sexual;
  • Nas fontes de informação sobre contraceção predomina a Internet;
  • Quem aconselha o método de contraceção é maioritariamente o médico;
  • A pílula continua a ser o método mais utilizado;
  • Verifica-se uma tendência para o maior uso de métodos não dependentes da utilizadora;
  • 80% das utilizadoras de preservativo pensam em contraceção e prevenção de IST;
  • 88% das mulheres sexualmente ativas conhece a pílula de emergência e 17% afirma já ter utilizado;
  • Em 81% das mulheres, a sua qualidade de vida melhorou com o uso de contraceção.

Artigo publicado na Edição de Setembro 2015 (nº 253)