O prémio Young Inventors, promovido pelo Instituto Europeu de Patentes (IEP), reconhece jovens inventores abaixo dos 30 anos de idade que tenham desenvolvido novas soluções que vão ao encontro dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável promovidos pela ONU. Tenho o privilégio de estar entre os 3 finalistas deste ano, com o projeto BATS. Um projeto que desenvolvi durante o mestrado de Informática no Instituto Superior Técnico e, tem como objetivo ultrapassar as barreiras apresentadas às crianças com deficiências visuais no ensino da literacia digital. Um projeto que continua a ser relevante nos dias de hoje, e que continuo a desenvolver no doutoramento da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.

Artigo da responsabilidade da Engª. Filipa Rocha, aluna de doutoramento na LASIGE, Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa

 

A OMS estima que na Europa 1 em cada 30 pessoas experiencia perda de visão ao longo da sua vida. É uma condição que pode afetar qualquer idade e, por vezes, está associada a outras doenças ou tumores. Em idades mais tenras pode afetar o desenvolvimento cognitivo e o aproveitamento escolar das crianças. Torna-se necessário tomar medidas inclusivas em salas de aula, para que todas as crianças tenham oportunidade de tirar partido do ensino e desenvolver as suas capacidades cognitivas, sociais e académicas. O atual modelo de ensino inclusivo em Portugal oferece às crianças a participação em salas de aula convencionais, através de ferramentas de tecnologia assistiva, como lupas ou computadores com feedback áudio.

No entanto, nas salas de aula de tecnologia, será que todas as crianças podem tirar partido dos ambientes de programação utilizados? A tecnologia está muito presente no nosso dia a dia, e as crianças viverão num futuro onde a tecnologia dominará e estará presente em todas as profissões. Ao aprenderem a programar, as crianças têm a oportunidade de desenvolver a sua criatividade, capacidade de pensamento crítico e literacia digital em geral. Ao participarem nas aulas de tecnologia, as crianças deixam de ser apenas utilizadores passivos, mas passam a compreender a tecnologia que perfaz o seu dia a dia.

Em salas de aula, normalmente, são utilizados ambientes virtuais e baseados em elementos visuais, como por exemplo, o Scratch. Estes ambientes de programação introdutórios, tomam uma abordagem mais divertida no ensino de programação, utilizam blocos que representam ações para facilitar a criação de programas e diminuir a exigência cognitiva. No entanto, crianças com deficiências visuais não têm as mesmas oportunidades de aprendizagem que os seus colegas normovisuais. A interpretação em áudio destes ambientes de programação pode representar um exigência cognitiva mais elevada, sejam estas baseadas em texto ou em elementos visuais, e a descrição em áudio do código torna-se confusa e difícil de acompanhar. Segundo os direitos da criança reconhecidos pela ONU, todas as crianças têm o direito à educação e deve ser exercido “em igualdade de condições”. O que fez com que nos surgisse a questão: como dar igual oportunidade de uma aprendizagem divertida em contexto de programação informática?

No projeto BATS, o nosso objetivo é tornar os elementos dos ambientes de programação físicos, de maneira a serem acessíveis ao mesmo tempo que mantêm a componente de diversão. Os blocos de programação são físicos com elementos em relevo, que permitem o reconhecimento da peça e a exploração tangível, enquanto as crianças também desenvolvem a sua motricidade fina. Cada tipo de bloco representa uma ação, com uma cor diferente, relevos e forma específicos, de maneira a que as crianças possam identificar a ação e colocar o bloco na sequência para criar os seus programas. O programa produzido fica, assim, fisicamente disponível para as crianças estarem a par do estado do programa enquanto pensam, sem ter de extenuar a sua memória.

O resultado da programação é uma componente importante na compreensão de conceitos computacionais, que tem por costume ser visual no ecrã do computador e, ao ser traduzido em áudio não vai promover o mesmo tipo de envolvimento e diversão para as crianças que não o podem ver. A fim de permitir interação na interpretação do resultado do programa, no projecto BATS, fazemos uso de um robô. Por si, um elemento que já é associado à brincadeira, permite às crianças percecionar o seu comportamento de uma forma multimodal, seguindo o seu movimento físico, o som e as luzes.

Ao incluir estas componentes multimodais no ambiente computacional, queremos equilibrar as oportunidades que permitam às crianças explorar e aprender de uma forma divertida com os seus colegas dentro da sala de aula. Para tal, durante o desenvolvimento do projeto, o mais importante é envolver as crianças, as suas famílias e professores. Serão as crianças que vão utilizar os blocos e o robô, em ambiente escolar ou familiar, para desenvolver as suas capacidades. O ambiente de programação tem de desafiar a sua criatividade, vontade de participação e aprofundar os seus conhecimentos. É das crianças que precisamos como os próximos inventores, e para tal, é necessário fornecer-lhes as ferramentas e as oportunidades necessárias.