O cyberbullying tem vindo a revelar-se um problema crescente e pode ter graves consequências para o desenvolvimento emocional e psicológico. Neste artigo, vamos abordar o conceito no contexto escolar, o que é e como pode afetar jovens nas diferentes fases de desenvolvimento, bem como os sinais a que os pais e educadores devem estar atentos, para poderem identificar o problema e ajudar atempadamente.
Artigo da responsabilidade da Dra. Marta Duarte. Psicóloga Clínica. Gestora Executiva do CACB e sócia da girohc.pt
Vivemos, atualmente, uma realidade na qual a internet ocupa um lugar de destaque e preenche uma parte considerável do nosso dia-a-dia. Dos mais novos aos mais velhos, poucos são os que não apreciam a utilização da internet para os mais diversos fins. Não seria este um tema de conversa se o seu uso, em algumas situações, não se tivesse tornado um problema.
Se, por um lado, a conectividade digital nos trouxe muitos benefícios, por outro, apresenta também novos desafios. O cyberbullying veio ampliar a problemática, já antes observada e designada de bullying. Enquanto esta se limitava ao ambiente escolar ou a outros espaços físicos, hoje ultrapassa essas barreiras e pode ocorrer a qualquer hora do dia, em qualquer lugar, através de dispositivos eletrónicos.
VÍTIMA ESPECIALMENTE VULNERÁVEL
O cyberbullying – ou ciberbullying – consiste no uso de tecnologias digitais para assediar, intimidar, humilhar ou prejudicar alguém. As formas mais comuns incluem o envio de mensagens ofensivas, a criação de rumores falsos, a partilha de imagens ou vídeos embaraçosos sem consentimento, a exclusão intencional de uma pessoa de grupos virtuais, entre outras. Enquanto o bullying tradicional ocorre em espaços físicos, face-to-face, o cyberbullying pode acontecer em qualquer momento, o que torna a vítima especialmente vulnerável.
Se o face-to-face pode, de alguma forma, inibir o bullie (aquele que provoca a agressão), no cyberbullying a distância física e, por vezes, até o anonimato que a internet permite facilitam a ação. Muitas vezes, os agressores escondem-se em perfis falsos ou pseudónimos, tornando mais difícil para a vítima conseguir identificar quem está por detrás do ataque. Tudo isto faz com que o impacto emocional seja ainda mais devastador.
Ser vítima desta prática é danoso em qualquer idade, mas pode ser especialmente marcante para os mais jovens, que ainda estão em fase de formação emocional e psicológica. Nesta fase, têm menos – ou não têm ainda – ferramentas que lhes permitam lidar com as agressões e as rejeições.
AMBIENTE PROPÍCIO
O ambiente escolar desempenha um papel fundamental no desenvolvimento das crianças, adolescentes e jovens, muito para além da aprendizagem dos conteúdos escolares obtidos na sala de aula.
A escola é um ambiente onde decorrem e se desenvolvem habilidades sociais, onde se aprende a lidar com desafios, onde se formam as primeiras amizades e se constrói a identidade. Estas experiências são essenciais para a formação de competências emocionais, como a empatia, a cooperação, a resiliência, entre tantas outras, que serão transportadas para a vida adulta. A convivência no ambiente escolar, com as suas dinâmicas de grupo e interações diversas, contribui de maneira decisiva para o crescimento integral.
Contudo, a escola, apesar de ser um espaço de aprendizagem e desenvolvimento, constitui também um ambiente propício ao surgimento de situações menos positivas, como o bullying e o cyberbullying. Na convivência diária entre pares é natural que surjam conflitos e, em alguns casos, comportamentos agressivos ou hostis. A pressão para ser aceite, a competição e a insegurança, próprias destas fases da vida, podem promover o aparecimento de comportamentos disfuncionais.
IMPACTOS VARIADOS
Piaget e Erikson definiram os estádios de desenvolvimento como etapas sequenciais no crescimento cognitivo, emocional e social de uma criança, que ocorrem à medida que ela adquire novas habilidades e capacidades. Esses estágios são influenciados por fatores biológicos, emocionais, comportamentais e ambientais, sendo que nesta idade a vivência e a aprendizagem obtida no contexto escolar revestem-se de uma enorme relevância.
Assim, é fácil entender que os impactos do cyberbullying variam, dependendo da idade e da fase de desenvolvimento da criança, adolescente ou jovem. É, portanto, fundamental que pais e educadores compreendam como esse tipo de violência pode afetá-las e estejam atentos aos sinais.
Quando falamos em seres humanos não é possível construir uma matriz e garantir que determinada situação, em determinada idade, vai provocar determinado impacto. Somos todos diferentes e, por isso, reagimos à mesma situação de forma diferente, e isso deve-se à influência dos fatores referidos anteriormente.
DA FASE PRÉ-ESCOLAR À ADOLESCÊNCIA
Embora pareça improvável, até mesmo crianças pequenas, na fase pré-escolar ou nos primeiros anos do 1º ciclo, podem ser expostas ao cyberbullying. Com o aumento do uso de dispositivos como tablets e smartphones desde a infância, essas crianças podem ter acesso a jogos online ou redes sociais, onde incidentes de bullying digital podem ocorrer.
Nessa faixa etária, as crianças encontram-se numa fase de aprendizagem da componente emocional e cognitiva, o que significa que a capacidade de compreender e lidar com situações de conflito ou agressão ainda está em desenvolvimento. Estas crianças podem não conseguir entender o que se está a passar e não saber como expressar o que estão a viver e a sentir.
Nas crianças um pouco mais crescidas, dos 9 aos 12 anos, observa-se, com maior frequência, o aparecimento da autonomia no uso de equipamentos e redes sociais. Nesta fase, a pressão social intensifica-se e a aceitação entre pares torna-se um aspeto central da vida. O cyberbullying pode gerar um impacto ainda mais profundo, pois nesta idade já compreendem melhor as interações sociais, mas podem não ter maturidade emocional para lidar com ataques deste género.
A adolescência constitui um período especialmente vulnerável para o cyberbullying. Nesta fase, em que os jovens se encontram num processo de construção da identidade, da autoimagem e do autoconhecimento, a validação social por meio de amigos e colegas assume um peso muito relevante. O uso de redes sociais é intenso e o cyberbullying pode ter consequências devastadoras para o bem-estar emocional e psicológico.
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