A esclerose lateral amiotrófica é a doença neurodegenerativa mais frequente, logo a seguir à doença de Alzheimer e à doença de Parkinson.
Artigo da responsabilidade do Prof. Mamede de Carvalho, Neurologista do CHLN-HSM
Nas doenças neurodegenerativas ocorre a degenerescência e morte dos neurónios, células nervosas do sistema nervoso central. Na esclerose lateral amiotrófica (ELA), a perda dos neurónios ocorre, sobretudo, nas regiões motoras, o que causa fraqueza muscular progressiva. A ELA é a doença neurodegenerativa mais rápida, com uma esperança média de vida de 2 a 3 anos após os primeiros sintomas, embora cerca de 10% dos doentes sobrevivam mais de 10 anos e alguns 20 ou mais anos.
Sendo relativamente rara, esta doença afeta cerca de 700 pessoas em Portugal, com cerca de 200 novos doentes diagnosticados em cada ano. Devido à incapacidade motora, o impacto desta doença em termos individuais, familiares e sociais é enorme, a nível físico, emocional, profissional e económico.
SINTOMAS E EVOLUÇÃO
Na ELA, os músculos que fazem mexer o nosso corpo vão ficando mais fracos e cansam-se mais rapidamente, com grande atrofia muscular. Frequentemente, os doentes referem pequenos saltos involuntários nos músculos (fasciculações), fadiga e cãibras. Pode haver dificuldade na mobilização articular, por os músculos estarem mais presos (espasticidade). Dado termos músculos para mexer as pernas e os braços, para falarmos, para mastigarmos e engolirmos e, muito importante, para respirarmos e tossirmos, pode haver queixas envolvendo qualquer destas regiões (braços, pernas, boca, respiração). Alguns doentes referem ainda um aumento da quantidade de saliva (sialorreia), por dificuldade na sua deglutição automática.
Nesta doença, não existe envolvimento de neurónios relacionados com o controlo de outros músculos, como o músculo cardíaco ou o músculo liso (presente, por exemplo, no estômago, no intestino ou na bexiga); desta forma, não existe incontinência de esfíncteres, perda de visão ou de audição, nem perturbação das funções sexuais. A memória também não é afetada.
Qualquer pessoa pode vir a ter ELA, qualquer que seja a sua idade. No entanto, a idade média de início dos primeiros sintomas situa-se nos 60 anos. Os sexos feminino e masculino são igualmente atingidos. Em cerca de 5 a 10% dos casos, a doença é hereditária, por mutações em vários genes.
O diagnóstico é, sobretudo, baseado na observação clínica por um neurologista treinado em doenças neuromusculares. Muito importante é a realização do eletromiograma, um exame que estuda a atividade elétrica dos músculos, por um especialista bem treinado e experiente nestas doenças.
VIRTUDES DA TELEMONITORIZAÇÃO
Sabemos que a insuficiência respiratória é a principal causa de morte dos doentes com esclerose lateral amiotrófica. Assim, o mais importante é a possibilidade de ajudarmos os doentes a respirarem bem, promovendo uma boa oxigenação do sangue e dos tecidos.
Na verdade, a ventilação não-invasiva, pela qual os doentes são ajudados a respirar com o uso de uma máscara aplicada no rosto ou sobre a zona do nariz, através de um pequeno aparelho portátil que o doente usa em casa, permite aumentar o tempo de vida dos doentes em muitos meses, sendo a intervenção médica mais eficaz em termos de conforto e qualidade de vida.
Os equipamentos de ventilação não-invasiva têm tido uma progressiva melhoria técnica, sendo hoje mais eficazes, mais confortáveis, mais pequenos e mais inteligentes. Atualmente, graças à telemonitorização, é possível controlar o oxigénio do sangue do paciente, o que proporciona uma vigilância contínua da respiração, com possibilidade de ajuste rápidos do equipamento, evitando complicações e visitas ao hospital.
Estudos recentes indicam como principais ganhos com a telemonitorização dos doentes com ELA uma maior adesão ao tratamento e uma redução das complicações (menos consultas, menos idas à urgência, menos internamentos), por melhoria na prestação dos cuidados.
A inclusão da telemedicina e da telemonitorização tem sido definida como prioridade dos responsáveis pela Saúde, nomeadamente pelo aumento da proximidade entre os cuidados de saúde e os doentes, com impacto positivo na qualidade de vida. Tais passos estão também a ser dados em Portugal no tratamento da doença pulmonar obstrutiva crónica.
TERAPIAS A DIVERSOS NÍVEIS
Muitas vezes, os doentes ficam com uma fraqueza ao tossir, com riscos de infeção, o que implica a necessidade de usar aparelhos que ajudem a expulsão das secreções, como um aspirador convencional ou mesmo equipamentos de tosse assistida (“cough-assist”).
O tratamento inclui, ainda, terapêutica medicamentosa que combate a toxicidade do glutamato. Esta terapia aumenta a sobrevivência em alguns meses, sendo maior o efeito se tomado mais precocemente na evolução da doença; por isso, é importante que o diagnóstico seja o mais precoce possível.
Outros medicamentos com ação sintomática são também prescritos, sendo relevantes para aumentar o conforto dos doentes, como fluidificantes para as secreções, antidepressivos, ansiolíticos e analgésicos, se as articulações doerem por terem pouca mobilidade (músculos parados).
No entanto, outros tratamentos são importantes nesta doença, como a fisioterapia, a hidrocinesiterapia e a terapia ocupacional.
Existem cuidados básicos que permitem diminuir os riscos de engasgamento e eventual asfixia ou aspiração de secreções. Em caso de dificuldade da deglutição, o papel do terapeuta da fala/deglutição é fundamental, ensinando como ultrapassar este problema.
Poderá ser necessário a realização de gastrostomia percutânea endoscópica (PEG) se a alimentação for muito deficiente e/ou o risco de engasgamento for elevado. Contudo, a alimentação por via oral continua a ser possível, mesmo que tenha o tubo de gastrostomia.
Quando a linguagem se torna deficitária existem meios alternativos (e aumentativos) da mesma, como aplicações adaptadas aos telemóveis e computadores.
Atualmente, existe intensa investigação sobre esta doença, o que nos faz ficar otimistas quanto ao aparecimento de novos tratamentos, os quais irão, certamente, aumentar a esperança de vida, proporcionando mais qualidade de vida aos doentes e suas famílias.
Artigo publicado originalmente na edição de julho 2015 (nº 252)
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