Em Portugal, milhares de famílias vivem diariamente com a realidade das doenças raras. São doenças que, pela sua complexidade, exigem cuidados permanentes e especializados. Na maioria dos casos, esses cuidados recaem sobre familiares próximos, os cuidadores informais, que assumem responsabilidades contínuas, muitas vezes sem qualquer rede de apoio.

Artigo da responsabilidade de Palmira Martins. Assistente Social na RD-Portugal

 

Apesar de desempenharem um papel essencial na sustentabilidade do sistema de saúde, estes cuidadores permanecem invisíveis. Em muitos casos, a sociedade encara o seu papel como uma obrigação moral, esquecendo que cuidar de uma pessoa com doença rara não é comparável à parentalidade ou ao apoio familiar comuns. É um cuidar exigente, que consome tempo, energia física e saúde emocional, conduz ao isolamento social e retira oportunidades profissionais.

As doenças raras afetam não só quem recebe o diagnóstico, mas também os pais, irmãos e familiares diretos. Há crianças que se tornam cuidadoras dos próprios irmãos, ajudam os pais nas tarefas diárias e abdicam de parte da sua infância. Muitas vezes, é necessário escolher entre um brinquedo e uma terapia. Todo o universo familiar gira em torno da pessoa com doença rara, deixando os restantes para segundo plano.

Apesar de estar legislado o direito ao descanso do cuidador, não existem respostas acessíveis e adaptáveis à realidade destas famílias. As valências existentes foram desenhadas para outros perfis e não para cuidadores de pessoa com doença rara, criando uma discriminação que mantém estas famílias em regime de sobrecarga total.

Foi para responder a esta lacuna que nasceu o CUIDARaro, projeto pioneiro da RD-Portugal que disponibiliza 20 horas mensais de descanso aos cuidadores informais, através da substituição por cuidadores de substituição. Este apoio, que se prolonga durante um ano, representa muito mais do que tempo livre: significa devolver dignidade, saúde e esperança a quem vive sobrecarregado pela exigência de cuidar 24 horas por dia.

Não basta só substituir, é necessário proteger a saúde mental e utilizar práticas preventivas que potenciem um cuidado com suporte e retaguarda, para uma maior qualidade de vida dos cuidadores informais, que por sua vez se traduz no aumento da qualidade de vida das pessoas com doença rara. Cada hora de descanso concedida tem impacto direto: previne o esgotamento, reduz internamentos por exaustão e promove o acesso a uma saúde de qualidade.

O projeto vai além do descanso. Investe na capacitação de profissionais de saúde e do setor social, promove maior literacia e assegura um acompanhamento mais humanizado. Prevê ainda apoio específico a cuidadores em contexto de cuidados paliativos, ajuda-os a atravessar processos de luto e facilita a reintegração na vida ativa.

Dar voz a estes cuidadores é reconhecer que o cuidado não pode ser um ato solitário. O CUIDARaro mostra que é possível criar respostas inovadoras, justas e sustentáveis, capazes de chegar a todo o território nacional. Apoiar quem cuida é, em última análise, apoiar toda a sociedade.