A perda de uma relação íntima, para alguns, pode ser uma das experiências emocionalmente mais violenta das suas vidas. Saiba como lidar com este luto particularmente doloroso.

Artigo da responsabilidade da Dra. Sofia Gabriel. Psicóloga Clínica. Coautora do livro “Virar a Página – Como lidar com o fim de uma relação” (PACTOR)

 

Enquanto perda primária, a perda de um relacionamento envolve um conjunto de perdas secundárias. São disso exemplo:

  • a perda do presente, dado o vazio deixado pela quebra das rotinas partilhadas a dois, como as conversas no final do dia, os jantares e as caminhadas com os animais de companhia;
  • a perda do futuro, com a interrupção dos planos de casar e ter filho e de todos aqueles que foram desenhados a dois (o que a Psicologia designa por “luto pelo futuro não vivido”); e
  • a perda do passado, pela tendência a questionar as dinâmicas anteriores da relação e a história de amor, principalmente quando o término é desencadeado por uma traição. É comum surgirem questões como “Há quanto tempo ela estaria na vida dele?”, “Quando é que ela deixou de me amar?”, “Depois de tantas mentiras, o que é verdade na nossa história e passado?”.

IMPACTO NA AUTOESTIMA

Este processo de luto tende a apresentar um impacto destrutivo da autoestima, no sentido de sentimentos de falha, inadequação e desvalorização (“eu não fui suficiente”). Este tende a ser fomentado pelo estigma social que ainda permeia esta perda e que facilita que a pessoa em luto seja invadida por frases feitas, como “ainda és jovem” ou “vais encontrar outra pessoa”, as quais só aumentam o risco de a pessoa recorrer ao isolamento social, num momento em que o colo emocional da família e amigos seria fundamental.

ESTRATÉGIAS PARA SEGUIR EM FRENTE

A ciência psicológica tem vindo a apresentar estratégias identificadas como fundamentais para seguir em frente e recuperar o bem-estar emocional roubado por esta perda.

A título de exemplo, uma das estratégias é encontrar uma justificação para o término e um significado para a perda. A compreensão das razões para o término é indispensável para o bem-estar, para uma sensação de libertação emocional e para atenuar o risco de esperanças e fantasias de reconciliação, assim como de sentimen­tos e pensamentos irracionais de culpa (pois, na ausência de uma justificação ou resposta, recorrermos à autorresponsabilização).

Outro exemplo remete para a necessidade de não idealizar a pessoa perdida, isto é, não pensar somente nas características positivas do outro e da relação perdida, ignorando totalmente características negativas, incompatibilidades e momentos de mal-estar e sofrimento no passado da relação. Uma imagem idealizada do outro tende a roubar a segurança relativa ao porquê do término e, por sua vez, a fomentar o sofrimento da pessoa em luto.

DESCONEXÃO DIGITAL

Torna-se igualmente importante não procurar a pessoa perdida no quotidiano, o que inclui, natural­mente, as redes sociais. Ainda que possa ser devastador perder todas as pontes digitais estabele­cidas com a pessoa perdida, é uma forma de iniciar a rutura da vinculação.

As pessoas que tendem a monitorizar o comportamento do ex­-companheiro nas redes sociais vivenciam níveis mais elevados de stress. A pessoa em luto, que se en­contra em casa, triste, devastada e a chorar, pode ser surpreendida, através das redes sociais, por uma fotografia do ex-companheiro num momento de lazer e diversão, alimentando, assim, os sentimentos de tristeza, mal­-estar e injustiça (“Enquanto eu estou em casa a chorar, ele está a viver a vida dele e a divertir-se”).

MANTER A DISTÂNCIA

Outra tarefa fundamental concerne retirar os pertences que recordam a pessoa perdida e ativam a dor emocional. É tão importante manter a distância e desconexão emocional no mundo digital como no mundo real, pois todos os pertences (roupas, fotogra­fias e objetos) são representações físicas e simbólicas da relação perdida. Ao mantermos esses elementos, conservamos e recordamos a ligação outrora valorizada.

Os pertences que vamos encontrando em casa ou no carro, após o tér­mino, muitas vezes funcionam como motivos para o diálogo com o outro (por exemplo, ligar ou enviar mensagem a perguntar o que fazer com esses pertences). No entanto, como mencionado, é importante manter a distância e não alimentar o diálogo.

ESCRITA TERAPÊUTICA

Ao longo de todo o processo de luto, para alguns, é importante recorrer também à ferramenta da escrita terapêutica, uma vez que permite libertar emoções e organizar pensamentos. Tome-se como exemplo escrever uma carta de despedida, uma a pedir perdão ou a exigir um pedido de desculpas ou, ainda, a escrita dos principais pensamentos, medos e preocupações num diário.