O OBJETIVO DESTE ARTIGO É ANALISAR ALGUMAS DAS IDEIAS LIGADAS AO COLESTEROL E REFORÇÁ-LAS OU REBATÊ-LAS, EM FUNÇÃO DA EVIDÊNCIA EXISTENTE.
Artigo da responsabilidade do Prof. Pedro Monteiro, Médico no Serviço de Cardiologia A do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra
O colesterol elevado, que a comunidade médica designa por hipercolesterolemia, é uma situação muito comum na população portuguesa, sendo que alguns estudos apontam para que 1 em cada 3 portugueses adultos tenham colesterol elevado.
Nos últimos anos, assistimos a importantes avanços relativos a esta doença, com particular relevância para a sua estratificação de risco, com a definição de limites de normalidade progressivamente inferiores, e para o seu tratamento farmacológico, orientado para a redução dos valores de colesterol, sobretudo o dito “mau” colesterol ou colesterol LDL, tendo como objetivo último a prevenção da sua principal complicação, a doença coronária (e dentro desta, sobretudo, o enfarte agudo do miocárdio).
Apesar de todos estes avanços e do muito que se tem investido na melhoria do conhecimento relacionado com a hipercolesterolemia e do seu diagnóstico e tratamento, persistem ainda numerosos e importantes desafios.
O objetivo deste artigo é analisar algumas das ideias ligadas ao colesterol, particularmente entre os portugueses, e reforçá-las ou rebatê-las, em função da evidência existente.
O QUE É ISSO DO BOM E MAU COLESTEROL?
O colesterol é todo igual, mas o seu caráter benigno ou maligno depende do tipo de lipoproteínas a que está ligado. Se estiver ligado a lipoproteínas de baixa densidade (LDL), é considerado mau colesterol, pois é este colesterol que se deposita na parede das artérias; se estiver ligado a lipoproteínas de alta densidade (HDL), é considerado bom colesterol, pois é este colesterol que é transportado das artérias para o fígado, a fim de ser reconvertido.
O COLESTEROL VEM DA DIETA?
Sim e não. Se é verdade que as gorduras de origem animal contêm colesterol, a maioria do colesterol que possuímos não provém da alimentação, mas é produzido no fígado. Isto explica que possa haver pessoas magras com colesterol elevado e pessoas obesas com colesterol relativamente baixo, e também porque é que mesmo uma dieta rigorosa tem habitualmente pouca influência no valor do nosso colesterol, ao contrário do impacto significativo que a dieta pode ter na nossa glicemia, peso e triglicéridos, pois todos estes parâmetros são maioritariamente influenciados pela nossa alimentação e atividade física.
OS MEDICAMENTOS PARA BAIXAR O COLESTEROL SÃO PERIGOSOS?
Não, os medicamentos disponíveis em Portugal são alvo de um rigoroso controlo de qualidade e só são aprovados mediante ensaios clínicos exigentes. Pelo contrário, os produtos “naturais” e “biológicos” não são alvo de qualquer controlo de qualidade ou vigilância, são habitualmente caros e, como a sua composição completa não é conhecida nem testada, podem levar a graves problemas de saúde.
OS MEDICAMENTOS PODEM TER EFEITOS SECUNDÁRIOS?
Sim, podem, mas é importante clarificar várias questões a este respeito, a começar por aquilo que se pode considerar um efeito secundário. É sabido que as estatinas podem dar dores musculares; quer isto dizer que, se eu estiver a tomar uma estatina e tiver uma dor muscular, isso é um efeito secundário das estatinas? A resposta é NÃO! Para uma dor muscular ser um efeito secundário das estatinas tem que ter as seguintes características: acontecer poucos dias após o início da estatina ou de uma nova dose de estatina, acontecer em quase todos os músculos do corpo, desaparecer quase de imediato com a suspensão da estatina e reaparecer quase de imediato com o reinício da estatina.
Pelo que acaba de ser descrito, facilmente se percebe que uma dor muscular num sítio específico do corpo não é culpa das estatinas e não deve levar à sua redução ou suspensão. Por outro lado, dores articulares ou ósseas não são efeito secundário das estatinas, pelo que não devem, de igual forma, levar à sua redução ou suspensão.
E O QUE DEVO FAZER SE TIVER UM VERDADEIRO EFEITO SECUNDÁRIO DAS ESTATINAS?
Deve falar com o seu médico, pois esse efeito secundário pode não acontecer com outra estatina e, mesmo que aconteça, pode-lhe ser receitado outro medicamento, como o ezetimibe.
E os produtos “naturais” e “biológicos” não dão dores musculares? Habitualmente não, pois são muito pouco potentes (por exemplo, levedura do arroz vermelho) ou totalmente ineficazes (os placebos não costumam dar efeitos secundários…). No entanto, como em muitos casos a sua composição não é conhecida nem regulada, podem conter substâncias perigosas e até mortais…
DURANTE QUANTO TEMPO TENHO DE FAZER A MEDICAÇÃO?
Uma vez que o colesterol é maioritariamente produzido no fígado e que o fígado está continuamente a produzir colesterol, a medicação tem de ser tomada de forma crónica, ou seja, para o resto da vida. Se num determinado momento reduzirmos a dose da medicação ou a interrompermos, o colesterol sobe de imediato, revertendo todos os benefícios da medicação tomada no passado.
Leia o artigo completo na edição de outubro 2020 (nº 309)