A par do papel essencial da prevenção naquele que é o cancro com maior mortalidade em Portugal, na Europa, bem como a nível mundial, também é verdade que a deteção precoce é capaz de mudar o rumo da doença. Assim, à questão, pode o rastreio de cancro do pulmão mudar a evolução da doença? A resposta é, sem dúvida alguma, sim!
Artigo da responsabilidade da Dra. Fernanda Estevinho. Oncologista no Hospital Pedro Hispano, ULS Matosinhos. Membro da Aliança para o Cancro do Pulmão
Efetivamente, no cancro do pulmão junta-se a tríade necessária para que o rastreio seja a estratégia a seguir: uma doença com elevada prevalência e mortalidade, tratamentos mais eficazes para a doença numa fase inicial e a existência de um exame capaz de detetar precocemente a doença.
Começando pelo primeiro ponto, o cancro do pulmão é o mais frequente a nível mundial, registando em 2022 cerca de 2,48 milhões de novos diagnósticos e 1,82 milhões de mortes.
Em Portugal, no mesmo ano, 6155 pessoas receberam este diagnóstico, registando-se 5077 óbitos. A elevada letalidade está associada à doença avançada no momento do diagnóstico, o que acontece a três em cada quatro pessoas.
Depois, se numa fase inicial é possível tratar de forma localizada e obter uma taxa de sobrevivência de 92% aos cinco anos, ou seja, mais de nove em cada 10 pessoas continuarão vivas cinco anos após o diagnóstico, a situação altera-se radicalmente quando o doente apresenta metástases no momento do diagnóstico, e a taxa de sobrevivência passa a ser inferior a 10%.
E existe um exame capaz de detetar precocemente a doença em pessoas de risco – a Tomografia computorizada (TAC) torácica de baixa dose. Quando falamos em pessoas de risco, o principal fator é o consumo tabágico. Assim, as normas de orientação americanas do National Comprehensive Cancer Network (NCCN) consideram que o rastreio de cancro do pulmão deve ser proporcionado a fumadores/ex-fumadores com idade igual ou superior a 50 anos e que fumaram o correspondente a 1maço de tabaco por dia durante 20 anos.
Sabemos, através de diversos estudos internacionais que a redução de mortalidade com o rastreio de cancro do pulmão excede os 20%. Assim, importa destacar dois desses estudos: o National Lung Screening Trial (NSLT) e o estudo NELSON, que avaliaram 53.454 e 15.789 pessoas, respetivamente. É importante referir que, em simultâneo à TAC torácica é realizada consulta de cessação tabágica, recordando que os hábitos tabágicos são responsáveis por cerca de 80% dos diagnósticos de cancro do pulmão.
Outro estudo inglês, UK Lung Cancer Screening Pilot Trial (UKLS) demonstrou que nos doentes a quem a doença foi detetada através do rastreio, oito em cada 10, foi possível realizar tratamento radical por apresentarem doença localizada. Ou seja, passamos a diagnosticar a doença numa fase precoce, em que é possível tratamento localizado, a que se associa maior sobrevivência e maior qualidade de vida.
Em função destes resultados, a Comissão Europeia aconselhou a implementação de programas de rastreio de cancro do pulmão com TAC torácica de baixa dose em populações de risco.
O trajeto do rastreio do cancro do pulmão em Portugal iniciou-se com a apresentação de um desenho do projeto piloto pela Pulmonale em 2022. Seguiu-se a sua publicação, acompanhada de um artigo de consenso realizado por sociedades científicas e posteriormente um outro que revelou que o rastreio do cancro do pulmão é custo-efetivo em Portugal. Em 2025 assistimos ao anúncio pela Direção-Geral da Saúde (DGS) de orientações para “Projetos-Piloto para Rastreio de Cancro do Pulmão”, e do seu arranque nas regiões de Lisboa e do Norte.
O rastreio do cancro do pulmão traz novas esperanças, mas é preciso lembrar que é importante reduzir o risco, e que todos devemos estar alerta para os sinais de alarme: o aparecimento ou agravamento de tosse, infeções respiratórias repetidas, sangue na expetoração, dor ao respirar ou tossir, rouquidão, respiração ruidosa, falta de ar ou sensação de cansaço após esforços que antes realizava sem dificuldade.
Importante é que vigie a sua saúde, criando hábitos de vida saudáveis, cumprindo os rastreios recomendados e, que na presença de sinais de alarme, contacte o seu médico.













