Estudo demonstra ligação entre problemas na alimentação e questões emocionais e comportamentais em crianças e adolescentes
O estudo foi realizado por docentes e investigadores da Faculdade de Educação e Psicologia (FEP) da Universidade Católica no Porto e publicado na revista de referência “Journal of Child and Family Studies” com o propósito de contribuir para a compreensão dos problemas da alimentação e da ingestão de alimentos na vida das crianças e adolescentes portugueses. Uma das principais conclusões é de que é preciso que exista um “olhar integrador sobre o funcionamento global das crianças e adolescentes quando o objetivo é compreender o terreno favorável para a emergência de problemas da ingestão e alimentação.”
Os comportamentos alimentares das crianças e jovens nos dias de hoje são cada vez mais um motivo de debate e preocupação principalmente por parte dos pais, captando, por isso, uma crescente atenção dos clínicos e investigadores. Assim, o principal foco desta investigação foi precisamente o de compreender os mecanismos coexistentes entre o comportamento alimentar e o funcionamento psicológico global de crianças e adolescentes através de uma amostra não-clínica. A realização do estudo foi, também, motivada para compreender os problemas da alimentação e da ingestão considerando a perceção dos pais e professores.
“Frequency and Correlates of Picky Eating And Overeating in School-aged Children: A Portuguese Population-based Study”, é o nome do estudo desenvolvido por docentes da Faculdade de Educação e Psicologia da Católica no Porto e investigadores do Centro de Investigação para o Desenvolvimento Humano (CEDH), tendo como autores Bárbara Cesar Machado, Pedro Dias, Vânia Sousa Lima e Alexandra Carneiro – em co-autoria com Sónia Gonçalves (investigadora do GEPA, Unidade de Investigação em Psicoterapia e Psicopatologia do CIPsi – Escola de Psicologia, Universidade do Minho).
A investigação centrou-se na avaliação de um conjunto diversificado de problemas emocionais e comportamentais, incluindo a presença de picky eating (alimentação restritiva) e overeating (alimentação excessiva), em crianças e adolescentes com idades compreendidas entre os 6 e os 18 anos, numa amostra total de 2687 jovens. Esta avaliação contou com a colaboração de pais, professores e dos próprios jovens, considerando a perspetiva de cada um.
De acordo com Bárbara Cesar Machado, uma das autoras do estudo e docente da Faculdade de Educação e Psicologia, “há poucos estudos que combinem a avaliação do picky eating e do overeating em populações não-clínicas em idade escolar (6-18 anos), sobretudo se procurarmos relacionar aqueles comportamentos alimentares com a co-ocorrência de problemas emocionais e comportamentais.”
A investigadora acrescenta ainda que: “Existem vantagens na compreensão destes comportamentos numa moldura que enquadre os diversos aspetos do funcionamento comportamental, emocional e social das crianças e adolescentes, quer do ponto de vista adaptativo, quer desadaptativo, para além de também serem consideradas as competências das crianças e adolescentes (sociais, escolares e relacionadas com as atividades que desenvolvem)”.
Uma das principais conclusões deste estudo revelou que o picky eating foi identificado em 23.1% dos participantes, sendo este mais comum nas crianças mais novas. Já o overeating foi identificado em 24% dos participantes, sendo mais comum nas crianças mais velhas, com nível socio-económico mais baixo e com excesso de peso. Além disso, os resultados evidenciaram que tanto o picky eating como o overeating estão associados à presença de um conjunto diversificado de problemas emocionais e comportamentais nas crianças e adolescentes, e que por sua vez a presença destes problemas foi preditora do picky eating e overeating.
O principal contributo deste artigo foi reforçar que os resultados da investigação suportam a “possibilidade de um padrão mais vasto de problemas emocionais e comportamentais, potencialmente desadaptativos, poderem estar associados à presença de picky eating e de overeating”. Conclui-se ainda a necessidade de haver um olhar integrador sobre o funcionamento global das crianças e adolescentes quando o objetivo é compreender o terreno favorável para a emergência de problemas da ingestão e alimentação, ao longo das diferentes etapas de desenvolvimento das crianças e adolescentes. De acordo com a autora “Através da utilização da bateria de avaliação ASEBA somos capazes de avaliar o picky eating e o overeating, podendo ajudar a contribuir para o prognóstico, curso e evolução de comportamentos que podem ser transitórios ou, pelo contrário, ter uma duração mais prolongada”.