O AUMENTO DA ESPERANÇA DE VIDA E A ELEVADA PREVALÊNCIA DA DOENÇA ONCOLÓGICA NO MUNDO ATUAL SÃO FATORES QUE, EM ASSOCIAÇÃO COM A UTILIZAÇÃO DE TERAPÊUTICA ANTINEOPLÁSICA COM POTENCIAL TROMBOGÉNICO, TÊM CONDICIONADO, NOS ÚLTIMOS ANOS, UM INCREMENTO SIGNIFICATIVO DA TROMBOSE ASSOCIADA A CANCRO.

Pelo Dr. Ricardo Pinto. Assistente Hospitalar de Imuno-Hemoterapia. Serviço de Imuno-Hemoterapia – Centro Hospitalar de Entre o Douro e Vouga, E.P.E. Membro da Direção do Grupo de Estudos de Cancro e Trombose (GESCAT)

 

A somar ao que foi dito inicialmente, uma melhor perceção da forte associação do cancro e trombose, a maior utilização de exames de imagem no estadiamento do doente oncológico e a prescrição de novos agentes antiangiogénicos parecem contribuir decisivamente para este crescimento, nas últimas décadas.

TEV É 4 A 7 VEZES MAIS COMUM NO DOENTE ONCOLÓGICO

A trombose é a patologia subjacente à doença cardíaca isquémica, ao acidente vascular cerebral isquémico e ao tromboembolismo venoso (TEV), doenças comuns no mundo atual e identificadas como as principais causas de morte nos países desenvolvidos.

Existem fortes evidências de que a ocorrência de TEV aumenta com a idade, não devendo, no entanto, ser considerada uma patologia do idoso, uma vez que, entre os 40 e os 60 anos, atinge uma incidência estimada de 2 a 5 por 1000 habitantes. Este valor é particularmente elevado no doente com cancro, com um valor na ordem dos 20%, pelo que o TEV representa, neste âmbito populacional, uma importante causa de morbilidade e mortalidade, constituindo a segunda causa de morte após a doença primária.

Os doentes oncológicos apresentam um risco de tromboembolismo venoso 4 a 7 vezes mais elevado que a população em geral, sendo que 15% desenvolvem um episódio de TEV no decurso da sua doença, incidência variável de acordo com o tumor primário. Este risco é mais elevado nos primeiros meses após o diagnóstico da neoplasia e nos doentes com doença metastática avançada.

IMPACTO NEGATIVO NO PROGNÓSTICO

O TEV tem impacto negativo no prognóstico do doente oncológico e na sua qualidade de vida, porque acarreta a instituição de terapêutica anticoagulante prolongada, com um risco anual de 12% de complicações hemorrágicas e de até 20% de recorrência.

Um episódio de trombose pode implicar adiamentos ou descontinuação de tratamentos e obriga ao consumo de recursos de saúde significativos.

Encontram-se descritos inúmeros fatores de risco para a ocorrência de trombose associada à doença oncológica, que incluem os relacionados com o doente, com a patologia oncológica, com os tratamentos em curso e ainda alguns biomarcadores.

Dado que o TEV pode ser potencialmente evitável, os esforços da comunidade científica têm-se centrado na identificação destes marcadores, nomeadamente parâmetros hematológicos, como o valor de hemoglobina, leucócitos e contagem plaquetária, bem como fator tecidual, D-Dímeros ou P-seletina. Alguns destes incorporados em scores de avaliação de risco, com o objetivo de identificar doentes de ambulatório sob quimioterapia que poderiam beneficiar de tromboprofilaxia farmacológica.

Muitos destes parâmetros têm por base o conhecimento científico dos mecanismos fisiopatológicos que condicionam a forte associação entre trombose e cancro, sendo imperativo a clarificação destes processos subjacentes para a construção de modelos preditivos de trombose mais específicos.

Considerando os riscos inerentes da trombose em Oncologia, a profilaxia é recomendada apenas em doentes selecionados de risco moderado a alto. Na profilaxia no âmbito da grande cirurgia oncológica, a extensão no tempo de profilaxia é uma recomendação universal, devendo abranger, pelo menos, 4 semanas.

NECESSIDADE DE RÁPIDO DIAGNÓSTICO

Apesar das evidências do risco aumentado de TEV e da proteção conferida pela anticoagulação profilática, os estudos têm demonstrado uma baixa adesão à profilaxia nas situações de benefício inequívoco.

Contudo, mesmo nos doentes sob profilaxia, a trombose pode ocorrer, com apresentações clínicas variadas, sendo as mais comuns a embolia pulmonar e a trombose venosa profunda, podendo ainda ocorrer fenómenos trombóticos nos vasos viscerais ou esplâncnicos e associados à presença de dispositivos como cateteres venosos centrais.

O recurso a exames de imagem para o estadiamento inicial e a avaliação periódica de resposta ao tratamento oncológic, implica que um grande número de eventos trombóticos seja diagnosticado de forma incidental, requerendo, contudo, igual tratamento ao instituído nos episódios sintomáticos, uma vez que o potencial risco de vida e de recorrência são idênticos.

Leia o artigo completo na edição de janeiro 2022 (nº 323)