Apesar de continuar a revelar-se como um problema de saúde pública, não só em Portugal como a nível mundial, a osteoporose é uma doença passível de ser prevenida e controlada.

Artigo da responsabilidade do Dr. Ricardo Figueira. Médico especialista em Medicina Física e de Reabilitação. Fundador da SPORTYUS – Shoulder & Spine Performance

 

A osteoporose é uma doença silenciosa em que ocorre um aumento da porosidade do osso, com agravamento do risco de fratura. A diminuição da qualidade de vida e da independência são resultado das consequências da doença, as fraturas ósseas de fragilidade.

Os principais fatores de risco associados ao aumento de prevalência de osteoporose são a idade (mulher mais de 65 anos, homem mais de 70 anos), as alterações hormonais da mulher pós-menopausa (diminuição de produção de estrogénios), atividade física reduzida, baixo índice ponderal, tabagismo, consumo excessivo de bebidas alcoólicas, toma de medicação que induza perda de densidade óssea (por exemplo, a corticoterapia), doenças que induzem perda de densidade óssea (doença oncológica e hipertiroidismo, entre outras) e história familiar de fraturas do colo do fémur

Sendo silenciosa e, por isso, frequentemente não prevenida ou sub-tratada, muitas vezes o primeiro sinal da sua existência é a quebra desse mesmo silêncio com a ocorrência de uma fratura, seja do colo do fémur, seja vertebral, sem que haja um traumatismo com energia justificativa para a causar. Neste sentido, o impacto clínico, social e financeiro desta doença é proporcional ao aumento da esperança média de vida, que se associa à diminuição da atividade física, com consequências como a perda de força muscular, do equilíbrio e dos mecanismos de controlo do risco de queda.

Ainda que haja uma consciencialização crescente, tanto dos prestadores de cuidados de saúde como da própria sociedade para o tema, ainda ocorrem diariamente em Portugal 194 fraturas osteoporóticas. Estima-se que, nas mulheres com 65 ou mais anos, a prevalência de osteoporose é de 49,5%. Estes valores são, não só preocupantes no que diz respeito às consequências imediatas das fraturas, como a dor e a limitação funcional, mas acima de tudo acarretam um aumento da morbilidade e mortalidade consideráveis. Na população idosa, a taxa de mortalidade no primeiro ano após uma fratura de fragilidade do fémur proximal é de 26%.

Torna-se premente alertar e informar a população, bem como detetar precocemente todos aqueles que estejam em risco de sofrer uma primeira fratura, com o objetivo de a prevenir. Devem ser implementadas medidas que limitem a transição de um estado de osteopenia (condição pré-clínica de perda de massa óssea sem que haja aumento significativo do risco de fratura) para a osteoporose.

Ferramenta de cálculo de risco de fratura

Desde há vários anos que o diagnóstico e o controlo evolutivo da osteoporose se estabelece com base no exame osteodensitometria(DXA). Porém, nos últimos anos tem-se verificado que mais de metade das pessoas com uma primeira fratura de fragilidade não tem diagnóstico de osteoporose com base na densitometria.

Por esta razão, os critérios de diagnóstico têm vindo a ser atualizados desde 2018 (Recomendações da Sociedade Portuguesa de Reumatologia) e, para esta atualização na forma de avaliar e vigiar o risco de fraturas osteoporóticas, foi essencial o aparecimento de uma ferramenta de cálculo de risco de fratura, o FRAX (Fracture Risk Assessment Tool), que está disponível online. Esta ferramenta, já com validação para a população portuguesa (FRAX®Port), permite determinar o risco de fratura major osteoporótica (somatório do risco de fratura da anca, coluna vertebral, úmero ou antebraço) e de fratura da anca (colo do fémur) nos 10 anos subsequentes.

O cálculo integra um conjunto de fatores de risco de fratura bem estabelecidos, independentes da densidade mineral óssea (DMO): idade, sexo, índice de massa corporal, fraturas de fragilidade anteriores, antecedentes familiares de fratura da anca, utilização prolongada (mais de 3 meses) de glucocorticoides, artrite reumatoide, causas secundárias de osteoporose, tabagismo e consumo de álcool atual. Uma das vantagens desta ferramenta é a possibilidade de calcular o risco de fratura, orientando a abordagem diagnóstica e terapêutica, mesmo sem realização de osteodensitometria.

Segundo o estado da arte atual, deve calcular-se o FRAX®Port para todos os indivíduos com idade igual ou superior a 50 anos, estando indicada a realização de osteodensitometria apenas se o risco de fratura for considerado intermédio, ou seja: major > 7% e < 11%; e anca > 2% e < 3%.

Opções terapêuticas são muitas e com eficácia comprovada

Relativamente às opções terapêuticas não farmacológicas, a suplementação de vitamina D, em particular sob a forma de colecalciferol (vitamina D3), a suplementação cuidada de cálcio (quando necessária), a restrição ou abolição ao consumo de bebidas alcoólicas e cessação tabágica são essenciais.

O exercício físico, que difere da atividade física pela necessidade de ser prescrito por profissionais qualificados, como os profissionais da Educação Física e Desporto, os médicos especialista em Medicina Física e de Reabilitação e/ou Medicina Desportiva, destaca-se das restantes medidas terapêuticas não farmacológicas pela sua importância e necessidade de ser bem planeado, adaptado e individualizado sob pena de poder induzir risco de lesão.

O papel do exercício físico na prevenção e tratamento da osteoporose e a sua integração nos planos terapêuticos está validado e comprovado.

Em primeiro lugar, o exercício físico é essencial para promover a produção de massa magra (muscular), prevenir a sarcopenia (perda progressiva e generalizada de massa, força e função muscular que ocorre durante o envelhecimento) e subsequentemente manter a capacidade e independência funcional com o avançar da idade.

Em segundo lugar, o exercício físico prescrito e individualizado permite traçar objetivos, planear os tempos nos quais se atingem os mesmos e prevenir erros e riscos (desnecessários) de lesão no processo. Nota para a importância desse exercício ser acompanhado de forma a promover uma aprendizagem da técnica de execução, de progressão de cargas vigiada e protegida, com isto reduz-se o risco de complicações e lesões associadas.

Terceiro, contrariamente ao que era previamente assumido, o exercício físico deve envolver treino de força, em particular com cargas externas, pois pode abrandar a perda e até aumentar a densidade óssea, o que é de extrema importância quando falamos da associação da idade com a osteoporose. O stress induzido no osso pelo treino de força com cargas externas induz a formação de osteoblastos (células responsáveis pela síntese de componentes orgânicos de matriz óssea), devido ao estímulo mecânico que a contração muscular produz nas inserções ósseas dos músculos. Este stress mecânico é quantitativa e qualitativamente superior no treino de força com carga em relação ao treino aeróbio com peso corporal (corrida, jogging, caminhada). Além disso, o treino de força com cargas externas pode ser planeado para atuar de forma direcionada a nível da coluna vertebral, ancas, ombros e punhos, zonas mais frequentemente acometidas por fraturas de fragilidade.

Quarto, o exercício físico prescrito e acompanhado, permite otimizar ou corrigir fatores associados à fragilidade e ao risco de queda, como a perda de equilíbrio, de coordenação e de destreza motora. Estes fatores, quando diminuídos, são também promotores da perda de confiança e, por isso, levam à imobilização, isolamento e consequente fragilidade. É importante realçar que 28% a 35% dos indivíduos não institucionalizados com idade igual ou superior a 65 anos sofre uma queda por ano e, embora sejam frequentes na população geriátrica, as quedas não devem fazer parte do processo normal de envelhecimento.

Em suma, a osteoporose é uma doença passível de ser prevenida e controlada. Ainda assim, continua a revelar-se como um problema de saúde pública, não só em Portugal como a nível mundial. O FRAX®Port é, hoje, uma ferramenta diagnóstica completa, com base no cálculo do aumento do risco de fraturas major ou da anca a 10 anos, facilitando a orientação terapêutica, mesmo sem necessidade de osteodensitometria. O exercício físico prescrito por profissionais especializados, planeado, individualizado e acompanhado (com o objetivo do ensino), em particular o treino de força com cargas externas é uma medida terapêutica essencial à prevenção da ocorrência de quedas e promoção da densidade óssea, e subsequentemente, ao tratamento da osteoporose e suas consequências.