Por quantas segundas-feiras vai esperar, antes de começar a treinar? Quando foi a última vez que disse “é só hoje”, ao trocar o ginásio pelo sofá? Stress, cansaço, falta de energia, falta de tempo… Afinal, o que falta para ter essa tão aclamada motivação?

Artigo da responsabilidade da Prof.ª Ana Andrade. Doutoranda em Atividade Física e Saúde, pela Universidade Lusófona de Lisboa (ULHT). Mestre em Exercício e Bem-Estar, ULHT Lisboa. Personal Trainer e Group Trainer no Holmes Place Parque das Nações.

 

 

Segundo dados da Organização Mundial da Saúde, em 2018, no mundo inteiro, um em cada cinco adultos e quatro em cada cinco adolescentes não praticavam atividade física suficiente. De forma a combater os comportamentos sedentários, que cada vez ganham mais peso na nossa vida, é urgente encontrar soluções para que nos envolvamos em atividades que promovam um comportamento ativo.

Sabia que os 50% das pessoas que iniciam um programa de exercício físico em ginásios vão abandonar a prática durante os primeiros 6 meses? Não faça parte desta estatística e saiba o que pode fazer para se mexer mais.

 AFINAL, O QUE É A MOTIVAÇÃO?

Segundo o dicionário de Língua Portuguesa, a motivação define-se como “o ato de motivar ou de se motivar”.

Então, se estar motivado significa ter uma razão para fazer algo, para levar-nos a uma ação, de que tipo de motivação estamos a falar?

A motivação é o processo que concede ao comportamento força, pela intensidade e perseverança comportamental, e rumo, uma vez que o comportamento é dirigido para um objetivo ou fim. Define-se como o grau de determinação e desejo com o qual abordamos ou evitamos um comportamento. Essa determinação pode vir de diferentes fontes e devemos atentar para a qualidade da motivação. Deci e Ryan (1985) referem a existência de três forças motivacionais distintas que influenciam o comportamento humano: a motivação intrínseca (do prazer por fazer), a motivação extrínseca (pela obtenção de recompensa ou evitar punições) e a amotivação (ausência de motivação).

Para compreender este fenómeno complexo, devemos entender que talvez o conceito de ter “muita” ou “pouca” motivação de nada acrescenta, se não percebemos a real essência da questão. Inúmeras teorias têm estudado os comportamentos humanos que levam a motivação a passar a ação.

DA TEORIA À PRÁTICA

A Teoria da Autodeterminação (TAD) tem sido amplamente referenciada por estudar e tentar compreender os processos motivacionais relacionados com a saúde e bem-estar (Deci & Ryan, 2002). Segundo a TAD, é fundamental compreendermos o que caracteriza a motivação autónoma e a motivação controlada. A motivação autónoma é regulada por fatores intrínsecos (fazer por divertimento, satisfação da prática, fazer por mim), enquanto a motivação controlada é regulada por fatores externos (punições, recompensas, pela influência de outros sobre mim).

MOTIVAÇÃO AUTÓNOMA OU CONTROLADA: QUAIS AS REGULAÇÕES?

A motivação autónoma é caracterizada pela motivação intrínseca, quando iniciamos uma atividade pelo prazer associado à mesma; por uma regulação integrada, quando realizamos uma atividade porque está alinhada com a nossa entidade e valores; e por uma regulação identificada, quando realizamos uma atividade porque a mesma irá levar-nos a um determinado resultado.

A motivação controlada engloba a regulação introjetada, quando realizamos a atividade com o sentimento de culpa, punição; e a regulação externa, quando realizamos a atividade devido a pressão externa. Por último, temos a amotivação, que se traduz pela ausência de qualquer tipo de motivação.

DEFINIR OBJETIVOS

Quando decidimos iniciar a prática de exercício físico, temos sempre em mente um objetivo: uns para “se sentirem bem”, outros para “emagrecer”, entre outras razões. A questão que se coloca é: será que os meus objetivos interferem com a minha motivação? Seguramente! Para isso, a Teoria do Conteúdo do Objetivo (TCO) foca-se nos tipos distintos de objetivos de vida e ambições. Quando falamos de objetivos no âmbito do crescimento pessoal ou com vista a melhorar a nossa aptidão física, estamos a centrar-nos na natureza intrínseca. São objetivos satisfatórios de realizar e que vão ao encontro da base dos pilares principais da TAD, que caracterizam o ser humano como ativo, com uma vocação inata para se desenvolver. Quando nos focamos em objetivos como o peso ou a imagem, a natureza é extrínseca, orientados para o exterior do indivíduo.

É importante mencionar como os objetivos se interligam com o bem-estar e a harmonia pessoal, de acordo com a TCO. Objetivos intrínsecos estão positivamente associados ao bem-estar. Quando estamos focados em objetivos de natureza extrínseca, tendemos a realizar comparações interpessoais, aprovações, entre outras, apresentando um menor grau de satisfação com a vida, autoestima, ansiedade e qualidade nos relacionamentos, comparativamente quando estamos focados em objetivos de natureza intrínseca.

SATISFAÇÃO DAS NECESSIDADES PSICOLÓGICAS BÁSICAS

Competência, autonomia e relação positiva são as três necessidades psicológicas básicas que levará à promoção de bem-estar e a um maior grau de motivação para o exercício físico. Num estudo longitudinal, Ryan et al. (1997) concluiu que novos membros de um ginásio com maior utilização (ida ao ginásio, pelo menos, um dia em cada cinco, nas últimas 10 semanas) e menos utilização (frequentar o ginásio menos que o mencionado) diferem significativamente nos motivos da prática.

A adesão ao ginásio é maior quando associamos a prática ao prazer, à capacidade de realizar o exercício e à envolvente social. É menor quando associamos a prática aos conceitos de fitness, aparência, imagem corporal ou motivos relacionados com o peso.

SOLUÇÃO PARA UMA MELHOR MOTIVAÇÃO

Agora que já conhece a base para uma melhor qualidade da motivação, certamente se questionará: como posso por tudo isto em prática? Simplifique!

A melhor maneira de melhorar a qualidade da sua motivação é encontrar atividades que promovam prazer e divertimento, e com as quais se identifique e se sinta capaz de realizar (competência). Ter o poder de escolher (autonomia) o que fazer e a que intensidade deseja treinar também faz com que a suas regulações motivacionais sejam mais autónomas e, desta forma, se mantenha mais tempo na prática.

Por último, e não menos importante, privilegie atividades com que se identifique e que os seus pares realizem (relação positiva), pois também é determinante para a continuidade do exercício sentir-se parte de um grupo.

As aulas de grupo são uma boa solução para iniciar a prática. Por exemplo, se gosta de dançar, faça uma aula de zumba; se gosta de treinar força, mas não quer “treinar pesado”, opte por uma aula de Body Pump, entre outras.

Faça o que gosta de fazer, o importante é iniciar a prática e, claro, mantê-la como um estilo de vida, e não como uma obrigação com prazo de validade. Não se foque tanto na aparência ou fazer melhor do que pessoa “X”. Valorize o seu bem-estar, a sua qualidade de vida e sempre o prazer e a diversão na realização do exercício.

Leia o artigo completo na edição de novembro 2020 (nº 310)