A miopia em idade pediátrica está a surgir cada vez mais precocemente. No entanto, a implementação de medidas ambientais/comportamentais simples pode ajudar a controlar este processo. Também a avaliação periódica em consultas de oftalmologia pediátrica é recomendável.

 

Artigo da responsabilidade da Dra. Madalena Monteiro. Oftalmologista pediátrica do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra. Coordenadora do Grupo Português de Oftalmologia Pediátrica e Estrabismo da Sociedade Portuguesa de Oftalmologia

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Dra. Ana Vide Escada. Oftalmologista pediátrica do Hospital Garcia de Orta. Secretária-geral adjunta da SPO

 

 

O desenvolvimento do sistema visual é um processo complexo, que implica a existência de um sistema ótico (o olho), áreas cerebrais de processamento visual, onde é descodificada e integrada a informação visual, e as vias de comunicação entre ambos.

Os bebés possuem um sistema visual muito imaturo, cujo desenvolvimento implica uma estimulação visual correta, com grau de atenção suficiente para que exista um bom bio-feedback entre o olho e o cérebro.

O olho em si vai sofrer profundas alterações anatómicas ao longo do crescimento da criança. A título de exemplo, o comprimento axial do olho (ou seja, desde a parte mais anterior do olho à mais posterior) é de aproximadamente 17 mm ao nascimento, atingindo cerca de 22 mm aos 6 anos e estabilizando, geralmente, pelos 24,5 mm na adolescência. A curvatura da superfície anterior do olho (córnea) sofre igualmente enormes modificações com o crescimento. Estes dois parâmetros, em associação ao cristalino (lente natural do olho), constituem as principais superfícies óticas do olho e ditam o seu poder dióptrico.

APARECIMENTO CADA VEZ MAIS PRECOCE

A grande maioria das crianças são naturalmente hipermétropes, isto é, as imagens são focadas atrás do ponto focal ótimo do olho, pelo pequeno comprimento axial do seu olho, o que, sendo valores moderados, é benigno pela grande elasticidade no processo de focagem que as crianças possuem.

A miopia representa o oposto, ou seja, o foco dos objetos é anterior ao ponto focal, não permitindo a focagem ao longe, o que com o crescimento do próprio olho tem sempre tendência a progredir.

Importa referir que a miopia per se não é um problema, mas associa-se nos casos mais avançados com maior probabilidade de desenvolver alterações oculares graves, como o descolamento de retina ou a degenerescência macular miópica, com um prognóstico visual reservado.

Estima-se que em 2050, quase metade da população mundial será míope, contrastando com os 27% estimados em 2010, e este aumento é multifatorial, englobando fatores ambientais, genéticos e socioecónomicos. Os estudos realizados em associação às alterações comportamentais induzidas pelos períodos de confinamento pela pandemia da covid-19 têm apontado para o aparecimento cada vez mais precoce da miopia e uma progressão mais rápida da mesma. Como se pode, então, atuar?

CORRIGIR A MIOPIA

A sua necessidade de correção varia conforme o grau e a idade da criança. Por exemplo, crianças até aos 3 anos, sem outros problemas associados, não necessitam qualquer correção ótica até 2-3 dioptrias de miopia.

Obviamente, as crianças mais velhas, já em idade escolar, necessitam da correção total do seu erro refrativo. Já são comercializadas em Portugal lentes de tratamento para a miopia, que além de permitirem à criança focar ao longe, diminuem o ritmo de crescimento da mesma. Embora ainda não esteja disponível em Portugal, pode ser utilizada uma estratégia farmacológica, com instilação de gotas específicas, cujo objetivo é o mesmo.

É, portanto, muito importante a avaliação periódica das crianças em consulta de Oftalmologia, preferencialmente pediátrica, para avaliar o melhor timing e a melhor estratégia de tratamento para cada uma delas.

Leia o artigo completo na edição de junho 2022 (nº 328)