Assinala-se hoje, 27 de junho, o Dia Mundial do Microbioma, que tem como objetivo sensibilizar para a importância que estes seres microscópicos têm na preservação da saúde humana e do planeta. Estes microrganismos que estão em toda a parte – micróbios, bactérias, fungos – vivem também em comunidades no nosso organismo: pele, ouvidos, boca, pulmões e intestinos. A cada uma destas comunidades dá-se o nome microbiota* e tem um papel fundamental no equilíbrio do corpo humano. São os nossos escudos protetores contra doenças.

Uma das microbiotas mais importantes do corpo humano é a intestinal. Mais de 90% dos microrganismos que nos protegem estão no intestino e são tantos triliões que podem pesar até dois quilos. Estes microrganismos, na sua maioria bactérias, ajudam na absorção dos nutrientes e a prevenir e regular infeções em todo o corpo humano. A microbiota é crucial nos primeiros 1000 dias de vida, o período crítico do crescimento e desenvolvimento na primeira infância. Qualquer interferência no estabelecimento da microbiota intestinal nesta fase pode impactar de forma irreparável a saúde na fase adulta.

O desenvolvimento da microbiota e o seu equilíbrio durante a fase adulta são, por isso, importantes para garantir o bom funcionamento do sistema imunitário e prevenir doenças. Como há uma comunicação complexa e bidirecional entre sistema nervoso central e trato gastrointestinal – eixo intestino-cérebro – qualquer desequilíbrio (disbiose) nesta comunidade de microrganismos pode ser um “gatilho” para o desencadear de alterações metabólicas, não só associadas à obesidade, como a doenças neurodegenerativas, diabetes, cancro, doenças inflamatórias e cardiovasculares, do trato urinário e até do próprio intestino, como é o caso da síndrome do intestino irritável.

Apesar de haver ainda muito por descobrir sobre a microbiota – única em cada pessoa, como uma impressão digital – existem estudos que permitem aferir que podemos, através da dieta e da suplementação com probióticos, modular a comunidade de bactérias “boas” que habitam no nosso intestino. É, por isso, uma área com elevado potencial de investigação e aplicação clínica nas mais variadas especialidades médicas.

O que nos diz a investigação?

Dois investigadores da NOVA Medical School | Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa, Ana Faria e Fernando Pimentel-Santos, estão a desenvolver um projeto de investigação que visa identificar perfis específicos de microbiota e metabolitos para prever melhores terapêuticas para os doentes com espondilartrite e a artrite reumatoide. Este estudo, que está a ser desenvolvido ao abrigo de uma bolsa atribuída pela Biocodex Microbiota Foundation (BMF), pretende ser um contributo para um melhor entendimento de alguns mecanismos fisiopatológicos relacionados com o início da doença e verificar se existe um perfil de microbiota que possa estar associado à resposta terapêutica.

Fernando Pimentel-Santos reconhece que há um interesse crescente pela microbiota. “A associação de uma microbiota modificada, menos abundante e menos rica, com a doença, trouxe à tona e motivou estudos científicos que estabeleceram e destacaram a importância da microbiota, como no caso das doenças reumáticas”, sublinha.

Na Universidade do Porto, uma equipa de investigadores do i3S está a desenvolver o projeto PRIMING, que tem como objetivo compreender o impacto da obesidade materna na ativação e estimulação do sistema imunitário da criança induzido pela microbiota intestinal ao longo do primeiro ano de vida. Benedita Sampaio Maia, investigadora principal deste estudo, também em desenvolvimento com uma bolsa da BMF, afirma que os resultados da investigação podem abrir caminhos para o desenvolvimento de meios de diagnóstico precoce e de estratégias terapêuticas inovadoras e personalizadas.

Como podemos cuidar dos nossos micróbios?

Tanto Fernando Pimentel-Santos como Benedita Sampaio Maia defendem que a melhor forma de cuidar da nossa microbiota é através de hábitos alimentares saudáveis, como a dieta mediterrânea. “Há também evidências crescentes da possibilidade de se modular a microbiota, o que representa uma opção terapêutica fantástica”, refere o investigador da Faculdade de Ciências Médicas de Lisboa. Benedita Sampaio Maia reforça a importância da variedade: “Comer uma grande variedade de alimentos para se poder ter também uma grande diversidade nos micróbios que vivem no nosso intestino”.

Como reforçar o nosso exército de bactérias protetoras?

A composição da microbiota, além de evoluir ao longo de toda a nossa vida, desde o nascimento até a velhice é também o resultado de diferentes influências externas. Uma dieta diversificada, associada a hábitos de vida saudável, terá um impacto positivo no aparelho digestivo e no resto do organismo. Quando a alimentação não é suficiente, a suplementação com probióticos é uma alternativa terapêutica comprovada cientificamente para modular a microbiota ou restabelecer o seu equilíbrio.

Os probióticos são microrganismos que conferem benefícios para a saúde, desde o conforto digestivo à regulação do sistema imunitário, compensando agressões externas como o stress, a má alimentação ou toma de antibióticos, que matam, sem distinção, as bactérias nocivas e as que têm funções importantes para o normal funcionamento do organismo. A disbiose associada à toma de antibióticos, além de poder causar efeitos secundários indesejáveis limitados no tempo, como é o caso da diarreia, aumenta também o risco de desencadear outras doenças do aparelho digestivo e fora dele: asma, obesidade, doenças alérgicas, etc.

Muitos probióticos são provenientes de bactérias tradicionalmente usadas para fermentar alimentos. Estes microrganismos podem ser encontrados em iogurtes e leites fermentados, ou em suplementos/medicamentos.

*Microbiota e microbioma
Dá-se o nome de microbiota ao conjunto de microrganismos que habitam no nosso organismo. Microbioma é o conjunto dos seus genes.