A manutenção de um estado nutricional adequado é fundamental para a saúde e bem-estar dos doentes oncológicos.

 

Artigo da responsabilidade da Dra. Célia Lopes, nutricionista; Fresenius Kabi

 

A malnutrição associada à doença, como sinónimo de desnutrição, caracteriza-se pela impossibilidade em atingir as necessidades nutricionais através da alimentação habitual diária. Sendo um estado de insuficiente ingestão alimentar, a malnutrição resulta na perda de peso não programada, traduz-se na perda de massa muscular, e tem origem na falta de apetite, na diminuição da ingestão alimentar e em alterações no metabolismo e/ou digestão e absorção dos nutrientes.

Grupo de risco

Os doentes oncológicos são um grupo de risco para o desenvolvimento de malnutrição, uma vez que as alterações no metabolismo, associadas aos sintomas que experienciam, tornam-no mais suscetível ao desenvolvimento de desequilíbrios nutricionais. Os números são reveladores, estimando-se que um em cada três doentes oncológicos estão malnutridos, mesmo na presença de excesso de peso e obesidade.

A perda de peso é um dos sintomas mais frequentes da doença oncológica, mesmo antes do diagnóstico. Pela depleção da massa magra, a perda de peso, está associada à diminuição da eficácia dos tratamentos oncológicos, pela necessidade de reduzir a dose administrada de quimioterapia e de interromper ou adiar os ciclos de tratamento, estando, ainda, associada à diminuição da sobrevida. Quando o peso é estabilizado, verifica-se a diminuição das complicação associadas e a melhoria da sobrevida do doente oncológico.

De forma a evitar a deterioração do estado nutricional do doente oncológico, a monitorização frequente do peso corporal e massa muscular deve ser incluída aquando da implementação de um plano de cuidados nutricionais individualizado e adaptado às preferências do doente, às necessidades nutricionais e à condição clínica atual. Dietas restritivas não são recomendadas e devem ser evitadas, de modo a prevenir estados de malnutrição e o declínio funcional associado.

Necessidades proteicas e energéticas

As necessidades proteicas e energéticas encontram-se aumentadas na doença oncológica, pelo que o grande desafio da terapêutica nutricional é garantir o correto aporte nutricional diário, pelo aumento da ingestão de alimentos comuns. Verifica-se que grande parte dos doentes oncológicos não consegue colmatar o aumento das necessidades energéticas e proteicas apenas com a alimentação habitual, devido a complicações e/ou sintomas associados, como a falta de apetite.

Se para um adulto saudável recomenda-se a ingestão de 0,8 a 1 g de proteína/kg de peso por dia, para um doente oncológico recomenda-se a ingestão de 1 a 1,5 g de proteína/kg de peso por dia, o que significa que o doente oncológico necessita de um aporte de proteína superior a um adulto saudável. O aumento das necessidades prende-se com as alterações do metabolismo específicas da doença oncológica.

No entanto, apesar de existir um aumento nas necessidades, sabe-se que o doente oncológico ingere diariamente menos proteínas que um adulto saudável, sendo a sua ingestão proteica média de apenas 0,7g a 1 g de proteína/kg de peso por dia. O aporte proteico inferior às necessidades origina diminuição na força e função muscular, e consequentemente redução da mobilidade, independência e qualidade de vida.

Suplementação nutricional oral

A suplementação nutricional oral é recomendada como complemento da alimentação, para quando não é possível atingir as necessidades nutricionais somente com a alimentação habitual. Pela adequação do estado nutricional, os suplementos nutricionais orais representam uma solução clínica eficaz no tratamento da malnutrição, permitindo evitar complicações e melhorar a qualidade de vida dos doentes oncológicos e dos seus cuidadores e familiares. Um doente oncológico bem nutrido tolera melhor as terapêuticas antineoplásicas e apresenta menores taxas de complicações.

Os suplementos nutricionais orais devem ser introduzidos na dieta de forma progressiva, atingindo a dose recomendada nos primeiros 3 a 5 dias de terapêutica nutricional, e ser ingeridos continuamente pelo período de, pelo menos, 3 meses, ou de acordo com as recomendações específicas do profissional de saúde.

Devido à acentuada falta de apetite, o doente oncológico apresenta uma melhor adesão aos suplementos nutricionais de elevada densidade nutricional (3,2 kcal/ml) e de baixo volume (125ml). O suplemento nutricional oral recomendado para o doente oncológico deve fornecer, pelo menos, 400 kcal por frasco e um teor de proteína igual ou superior a 20 g de proteínas por dia, associado a alto teor em vitamina D e baixo volume.

Aconselhamento nutricional

O aconselhamento nutricional detalhado, ao doente e familiares/cuidadores, é fundamental para assegurar a ingestão nutricional adequada e a adesão aos suplementos nutricionais. É necessário explicar razões para a toma, os benefícios da suplementação nutricional, que existem diferentes sabores disponíveis e apresentações (líquidos, pudim, em pó), e o modo de utilização (ex.: ingerir entre as refeições ou à ceia, introduzir a suplementação de forma progressiva, sabor melhorado quando tomado frio, agitar antes de abrir).

A juntar às necessidades nutricionais específicas do doente oncológico, há que ter em conta que cada indivíduo experiencia diferentes sintomas e tem diferentes preferências alimentares, pelo que a adequação nutricional terá sempre de ser individualizada e monitorizada frequentemente. No caso da suplementação nutricional é importante ter em especial atenção a variedade de sabores e consistências disponíveis, para garantir uma correta adesão à terapêutica nutricional durante todo o tratamento.

É importante estar atento aos diferentes fatores que possam comprometer o estado nutricional e atuar precocemente, logo desde o diagnóstico. A manutenção de um estado nutricional adequado é fundamental para a saúde e bem-estar dos doentes oncológicos.