A prevalência das disfunções sexuais femininas é elevada e as suas causas nem sempre são fáceis de avaliar, pois tendem a ser multifatoriais, conjugando problemas físicos com fatores psicológicos. Atrasar a procura de ajuda levará ao agravamento da condição e à maior dificuldade na sua resolução.

 

Artigo da responsabilidade da Dra. Catarina Lucas. Psicóloga Clínica

 

 

Durante anos, a sexualidade na mulher foi olhada mediante a mesma lente com que se olhava para a sexualidade masculina, o que conduziu a um entendimento deficitário da mesma. Na verdade, a sexualidade feminina não deve ser vista em espelho em relação à sexualidade masculina, pois tem especificidades diferentes.

Os fatores implicados na sexualidade feminina nem sempre são os mesmos que os fatores implicados na sexualidade masculina, como é o caso do desejo sexual. Erradamente, assumimos, muitas vezes, que os preditores de desejo sexual no homem são os mesmos que os do desejo na mulher, o que traz dificuldades na sexualidade e na dinâmica relacional do casal.

Mais recentemente, temos assistido a um aumento no interesse pelo estudo da sexualidade feminina, passando esta a ser vista com uma lente própria, que permite compreender melhor os fatores implicados. Apesar disso, as variáveis implicadas na sexualidade feminina tendem a ser mais difíceis de investigar, o que continua a dificultar o entendimento.

NEM TODAS AS DIFICULDADES SÃO DISFUNÇÕES

Uma das situações que mais interfere com a vivência de uma sexualidade plena é a ocorrência de disfunções sexuais. O conceito de disfunção sexual diz respeito a uma vivência insatisfatória da sexualidade, tanto no que respeita ao desejo sexual como à própria resposta sexual.

Contudo, é importante ressalvar que nem todas as dificuldades que se fazem sentir nestes domínios correspondem a disfunções sexuais e que muitas destas dificuldades são contextuais e transitórias.

O estilo de vida atual, os desafios da sociedade em que vivemos, a parentalidade e as próprias dinâmicas conjugais interferem, muitas vezes, no nosso bem-estar e, por consequência, na sexualidade. Mas, para que estas dificuldades sejam consideradas uma disfunção, é preciso que determinados critérios estejam presentes, nomeadamente a recorrência da dificuldade e o sofrimento que gera no próprio ou no parceiro/a.

DISFUNÇÕES MAIS PREVALENTES

As disfunções sexuais podem ocorrer numa das várias fases do ciclo de resposta sexual humana, nomeadamente no desejo, na excitação sexual e no orgasmo, ou caraterizar-se por sintomas dolorosos no ato sexual. Surge, assim, a perturbação do desejo sexual, que inclui o desejo sexual hipoativo e a aversão ao sexo; a perturbação de excitação sexual; a perturbação do orgasmo; e a perturbação sexual por dor, onde se inclui a dispareunia (dor) e o vaginismo (contração involuntária dos músculos pélvicos).

Na mulher, a diminuição do desejo sexual é uma das dificuldades mais prevalentes, bem como a incapacidade de obtenção do orgasmo ou a contração dos músculos pélvicos que impede a penetração, gerando dor. A diminuição da lubrificação é também muito frequente. Importa ainda ressalvar dificuldades específicas associadas a fases concretas, como a gravidez e pós-parto, a menopausa ou a fase pré-menstrual, as quais devem ser cuidadosamente avaliadas.

CAUSAS FÍSICAS E PSICOLÓGICAS

A prevalência das disfunções sexuais em Portugal é elevada: situa-se entre os 25% e os 63%. As suas causas nem sempre são fáceis de avaliar, pois tendem a ser multifatoriais, conjugando problemas físicos (como, por exemplo, doenças hormonais ou toma de medicação) com fatores psicológicos, como ansiedade, depressão, baixa autoestima e relacionamento conjugal.

Tentar isolar as causas físicas ou as psicológicas poderá ser utópico, já que habitualmente as duas interagem entre si. As situações físicas geram dificuldades psicológicas e as questões psicológicas condicionam as físicas.

Na consulta de Sexologia, é muito comum apercebermo-nos da existência de um ciclo onde se torna difícil perceber a origem da disfunção, já que são notórios fatores físicos e psicológicos em interação, sem conseguirmos distinguir claramente onde se iniciaram as dificuldades. Se tivermos determinadas crenças e cognições associadas à sexualidade, é frequente que desenvolvamos dificuldades ao nível do desejo e da excitação ou, inclusivamente, a contração dos músculos pélvicos e dor. Mesmo nos casos em que a disfunção tem causa orgânica, os seus sintomas são, muitas vezes, agravados pelo impacto psicológico da mesma.

Leia o artigo completo na edição de fevereiro 2022 (nº 324)