Define-se como contraceção verde qualquer método anticoncetivo com repercussões limitadas no meio ambiente. Desde a manufaturação do contracetivo e respetiva distribuição, passando pela degradação no organismo, eliminação dos metabolitos (se aplicável) e impacto dos mesmos no meio ambiente. Estes aspetos são, atualmente, suscetíveis de reflexão.

 

Artigo da responsabilidade do Dr. Joaquim Neves  Especialista em Obstetrícia e Ginecologia

 

A contraceção intrauterina com dispositivos de cobre e os preservativos biodegradáveis correspondem aos exemplos mais recentes do que se aproxima de “amigo do ambiente” na área da contraceção.

Uma das características que se associa à anticonceção é o dinamismo na evolução e na elaboração de métodos, com atenção na procura de respostas às preocupações sugeridas, sobretudo pelas mulheres que utilizam os diferentes métodos.

BIOIDENTIDADE HORMONAL

A contraceção hormonal oral (vulgarmente chamada de pílula) constituiu um marco histórico para as mulheres e para a promoção do bem-estar geral e da saúde feminina.

As pílulas são os contracetivos mais divulgados em Portugal. Fará sentido continuar a modernizar as formulações orais, para garantir uma adesão adequada, sobretudo com satisfação das utilizadoras.

A notável evolução das formulações e dos princípios básicos desta variante da contraceção é visível, sempre com o intuito de minimizar os efeitos secundários (os mais importantes são raros), mantendo boa eficácia e efetividade contracetiva, agora com a preocupação do impacto ambiental.

Passámos a ter em Portugal um conceito que tem sido encorajado na área da contraceção hormonal: a bioidentidade hormonal/identidade do organismo às hormonas, com o objetivo de corrigir a hormonofobia. São princípios ativos eficazes na contraceção, com similaridade às hormonas naturais (estradiol e progesterona) e com a particularidade de, após a sua função, não existirem metabolitos com efeitos orgânicos, quer no ser humano, quer na natureza.

ASSOCIAÇÃO CONTRACETIVA “VERDE”

Existe uma opção contracetiva que comporta um estrogénio nativo, um puro estrogénio, com a síntese baseada em origem vegetal. A ação deste estrogénio é seletiva (apenas reconhecido pelos recetores do núcleo das células, não ativando outras vias estrogénicas das mesmas) e, após a função estabelecida, é metabolizado em derivados não ativos, que são eliminados para o meio ambiente, com resultados de estudos a revelarem ausência de impacto em peixes existentes nas águas superficiais.

A drosperinona é o componente progestagénico desta opção anticoncetiva, que apresenta biossimilaridade com a progesterona, com relevante efeito antiandrogénico, que é favorável às alterações da pele e com uma atividade biológica mais alargada (efeito contrativo mais prolongado). O efeito ambiental não está demonstrado na maturação sexual de bivalves, estando descritas alterações digestivas moleculares nos mesmos organismos.

Esta associação contracetiva revela-se com boa aceitabilidade pelas utilizadoras, baixa interferência no peso e no agravamento da acne, boa tolerância (1,5% de descontinuação), com perdas sanguíneas vaginais não programadas em menos de 1,5% dos casos nos estudos realizados.

Acrescenta-se, ainda, que a eficácia não foi influenciada pelo peso corporal e, comparativamente a outras formulações contracetivas correntes, teve menos impacto metabólico (perfil lipídico, glicémia, nos intermediários de risco cardiovascular), a destacar o efeito neutro na resistência aos fatores da coagulação, e sem repercussão nas enzimas do fígado, limitando a interação com outros medicamentos.

INÍCIO DE UMA NOVA ERA

Estaremos na presença de uma opção contracetiva sem etinilestradiol, com uma aplicação nova de um estrogénio natural, que pela primeira vez tem aplicação clínica. Em Portugal, o estradiol, a estrona (derivado do estradiol) e o etinilestradiol foram apontados como contaminantes com preocupação urgente (março/2019, Revista Recursos Hídricos), existindo em concentrações consideradas suficientes para causar disrupção no meio ambiente.

A nova associação anticoncetiva pode constituir o início de uma nova era na contraceção, devido aos componentes presentes, nomeadamente o novo estrogénio, por ser inovador na limitação da ação ambiental.