A aplicação das células estaminais provenientes tecido do cordão umbilical pode ser uma possível opção para o tratamento de diabetes tipo 2 futuramente, aponta um estudo publicado na revista científica World Journal of Diabetes.[i] O procedimento, realizado em contexto de ensaio clínico, melhorou os níveis de glicemia, restaurou a função das células β pancreáticas e reduziu a dose de agentes antidiabéticos.

Andreia Gomes, investigadora e Diretora Técnica e de Investigação e Desenvolvimento (I&D) do banco de células estaminais BebéVida, explica que “em patologias cuja prevalência é significativa, como a diabetes, o estudo da aplicação de células estaminais do cordão umbilical é uma realidade factual”. Vários estudos em laboratório e no contexto de ensaio clínico são conduzidos e “têm demonstrado a segurança e o sucesso destas na ajuda terapêutica no combate a estas patologias”.

Com o objetivo de aferir a eficácia e a segurança da utilização das células mesenquimais do cordão umbilical humano no tratamento da diabetes mellitus tipo 2 (DT2), o ensaio clínico publicado em outubro deste ano na revista científica World Journal of Diabetes assentou na infusão deste tipo de células em 16 pessoas com diabetes. Esta infusão refletiu-se na diminuição da dose dos fármacos antidiabéticos, dos quais 6 tiveram redução superior a 50% no uso dos antidiabéticos. Durante todo o período de intervenção, não se verificaram danos hepáticos ou outros efeitos colaterais, validando a segurança na aplicação das células estaminais do tecido do cordão umbilical para tratar pessoas com DT2.

Em 2021, o Departamento de Investigação Desenvolvimento e Inovação da BebéVida, em colaboração com a Faculdade de Medicina da Universidade do Porto publicou um estudo na revista científica Cell and Tissue Research, que refletiu sobre as investigações realizadas com recurso a células estaminais do tecido do cordão umbilical na DT2 e nas suas comorbilidades.[ii]

“Já nessa altura se percebeu que as células mesenquimais provenientes do tecido do cordão umbilical melhoram significativamente a recuperação funcional de tecido muscular cardíaco isquémico. Têm também efeitos nefroprotetores, retardam a progressão da retinopatia diabética e melhoram a função imune geral, com diminuição da inflamação crónica associada à diabetes”, recorda a especialista em biologia celular e molecular. “Constatámos ainda que a aplicação destas células acelera a cicatrização de feridas diabéticas, promovendo a regeneração tecidual e neovascularização”.

O cordão umbilical é uma fonte de células-estaminais hematopoiéticas e mesenquimais de fácil acesso, confiável e útil. “Estas células representam potenciais agentes terapêuticos com aplicação clínicas devido às suas características imunomoduladoras, não imunogénicas, secretoras e parácrinas, migratórias e proliferativas, entre outras.”, refere Andreia Gomes.

As características das células estaminais hematopoiéticas e mesenquimais têm atraído a atenção das comunidades científicas e médicas para o estudo destas e o seu uso como agente terapêutico ou coadjuvante em inúmeras patologias.

“Os números da diabetes são alarmantes, por isso é fundamental investigar e estudar todas as frentes em que se pode combater esta doença”, defende Andreia Gomes, alertando para a importância de guardar ou doar as células estaminais do cordão umbilical: “ao não guardar o cordão umbilical estamos a desperdiçar um potencial agente terapêutico”.

Em Portugal, estima-se que aproximadamente um milhão de pessoas viva com diabetes, embora 30% dos casos não estejam diagnosticados.[iii] O país regista uma das mais elevadas taxas de prevalência da diabetes na Europa, com cerca de 13% da população entre os 20 e os 79 anos a viver com a doença.[iv]

“A situação é ainda mais dramática tendo em consideração que o controlo diário para a maioria dos diabéticos ainda não é possível, principalmente para pessoas que vivem em países de baixo rendimento.”, remata a investigadora.

De acordo com a Federação Internacional de Diabetes, cerca de 537 milhões de pessoas em todo o mundo são diabéticas e prevê-se que este número aumente para mais de 700 milhões até 2040. Quase uma em cada duas pessoas com diabetes, o correspondente a cerca de 200 milhões de pessoas, desconhece a sua condição. [v]

Em 2021, a diabetes foi responsável por 6,7 milhões de mortes em termos globais e por 1,1 milhão só na Europa. Além disso, 541 milhões de adultos, em todo o mundo, apresentam intolerância à glicose, o que os coloca em alto risco de diabetes tipo 2.

 

[i] Lian XF, Lu DH, Liu HL, Liu YJ, Han XQ, Yang Y, Lin Y, Zeng QX, Huang ZJ, Xie F, Huang CH, Wu HM, Long AM, Deng LP, Zhang F. Effectiveness and safety of human umbilical cord-mesenchymal stem cells for treating type 2 diabetes mellitus. World J Diabetes. 2022 Oct 15;13(10):877-887. doi: 10.4239/wjd.v13.i10.877. PMID: 36312002; PMCID: PMC9606793.

[ii] Gomes A, Coelho P, Soares R, Costa R. Human umbilical cord mesenchymal stem cells in type 2 diabetes mellitus: the emerging therapeutic approach. Cell Tissue Res. 2021 Sep;385(3):497-518. doi: 10.1007/s00441-021-03461-4. Epub 2021 May 29. PMID: 34050823.

[iii] SPEDM. A doença que afeta um milhão de pessoas em portugal mas que 30% não sabe que a tem. Disponível em: https://www.spedm.pt/spedm/a-doenca-que-afeta-um-milhao-de-pessoas-em-portugal-mas-que-30-nao-sabe-que-a-tem/ [acedido em novembro de 2022].

[iv] SPMI. Pandemia agravou número de diabéticos não diagnosticados. Disponível em: https://www.spmi.pt/pandemia-agravou-numero-de-diabeticos-nao-diagnosticados/ [acedido em novembro de 2022].

[v] IDF Diabetes Atlas, 10th edition, International Diabetes Federation, 2021.